Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Publicada no Diário Eletrônico em 10/11/2023
ICMS - Aquisição de cana-de-açúcar em pé, com posterior revenda a usina produtora de açúcar - Corte e saída promovidos pela usina adquirente.
I. Não há incidência do ICMS na venda de plantação ou safra de cana-de-açúcar (cana-de-açúcar em pé). O fato gerador do ICMS, bem como as demais obrigações fiscais correspondentes, somente ocorrerá quando da saída da mercadoria (cana-de-açúcar cortada) do estabelecimento em que foi produzida.
II. Por ser o comprador da cana-de-açúcar em pé o responsável pelo corte e remoção da cana-de-açúcar cortada do estabelecimento rural, ou seja, por promover a saída da mercadoria, é ele o responsável pelo cumprimento das obrigações fiscais (principal e acessórias) relativas às operações sujeitas ao ICMS.
1. A Consulente que, segundo consulta ao CADESP (Cadastro de Contribuintes do Estado de São Paulo), exerce a atividade principal de comércio atacadista de matérias-primas agrícolas não especificadas anteriormente (CNAE 46.23-1/99), e que possui como atividade secundária a de cultivo de cana-de-açúcar (CNAE 01.13-0/00), relata que exercerá a atividade de compra e venda de cana-de-açúcar em pé, de modo que irá adquirir safra de cana-de-açúcar em pé de estabelecimentos rurais (pessoas físicas ou jurídicas) e, subsequentemente, promoverá a venda da cana-de-açúcar em pé a usina produtora de açúcar.
2. Menciona trecho da Resposta à Consulta Tributária 18.581/2018, afirmando que tal resposta teria tratado da possibilidade de aplicar a operação de venda à ordem, regulada no artigo 129 do Regulamento do ICMS (RICMS/2000), quando da aquisição de cana-de-açúcar de produtor rural e, posteriormente, venda da referida mercadoria para usina produtora de açúcar.
3. Acrescenta que possui contrato de compra e venda com uma usina, e não de financiamento, sendo que os contratos firmados não preveem a aquisição e revenda da "plantação", mas somente da safra de cana-de-açúcar. Expõe que a celebração dos contratos de compra e venda determina a transferência de titularidade da mercadoria.
4. Ao final, indaga:
4.1. se o ICMS será diferido nos termos do artigo 345 do RICMS/2000, na operação pretendida em que a usina produtora seria responsável por colher a cana-de-açúcar em pé diretamente no campo, promovendo, em seguida, a saída da mercadoria (cana-de-açúcar cortada) ao seu próprio estabelecimento industrial;
4.2. se, conforme a resposta à Consulta Tributária 18.581/2018, estão corretos os entendimentos de que (i) deve indicar na Nota Fiscal de aquisição de cana-de-açúcar o CFOP 1.102 ("compra para comercialização") e na Nota Fiscal de venda o CFOP 5.102 ("venda de mercadoria adquirida ou recebida de terceiros"); (ii) por ser a cana-de-açúcar colhida, transportada e pesada pela usina, todas as Notas Fiscais relacionadas às operações de compra e venda pela Consulente deverão ser emitidas, mensalmente, após o cumprimento, pela usina, das disposições do Anexo X do RICMS/2000; (iii) uma vez emitida a Nota Fiscal de venda pelo produtor rural (pessoa física ou jurídica), nos termos do artigo 129, § 2º, I, b, do RICMS/2000, estará dispensada da emissão da Nota Fiscal de entrada prevista no artigo 136, I, do RICMS/2000, ou, ainda, uma vez emitida pela Consulente a Nota Fiscal de entrada de aquisição de cana-de-açúcar, o produtor rural estaria dispensado da emissão da Nota Fiscal de venda, prevista no artigo 129, § 2º, I, b, do RICMS/2000; (iv) uma vez emitida pela usina a Nota Fiscal de entrada da cana-de-açúcar, após a colheita, transporte e ingresso das mercadorias no seu estabelecimento industrial, a Consulente estaria dispensada da emissão da Nota Fiscal de venda, prevista no artigo 129, § 2º, I, do RICMS/2000; (v) a Nota Fiscal de simples remessa (artigo 129, § 2º, I, a, do RICMS/2000) deverá ser emitida pelo produtor rural mesmo que seja pessoa física; e (vi) a Consulente está sujeita, na emissão da Nota Fiscal de entrada, ao preenchimento do registro "ZC" da NF-e.
4.3. Na hipótese de estar incorreto seu entendimento acerca do cumprimento das obrigações acessórias, solicita que seja fornecido esclarecimento detalhado sobre a emissão das Notas Fiscais correspondentes à operação pretendida.
5. Inicialmente, como a Consulente menciona a aquisição de cana-de-açúcar de produtor rural "pessoa física ou jurídica", informamos que produtor rural é "o empresário rural, pessoa natural, não equiparado a comerciante ou industrial, que realize profissionalmente atividade agropecuária, de extração e exploração vegetal ou animal, de pesca ou de armador de pesca" (§ 1º do artigo 32 do RICMS/2000).
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6. Além disso, ainda que a Consulente entenda que os contratos de compra e venda firmados geram repercussão tributária no âmbito do ICMS, é importante observar o previsto nos artigos 1º, I, 2º, I e 9 º, do RICMS/2000, os quais seguem:
"Artigo 1º - O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) incide sobre (Lei 6.374/89, art. 1º, na redação da Lei 10.619/00, art. 1º, I):
I - operação relativa à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias em qualquer estabelecimento;
(...)
Artigo 2º - Ocorre o fato gerador do imposto (Lei 6.374/89, art. 2º, na redação da Lei 10.619/00, art. 1º, II, e Lei Complementar federal 87/96, art. 12, XII, na redação da Lei Complementar 102/00, art. 1º):
I - na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
(...)
Artigo 9º - Contribuinte do imposto é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que de modo habitual ou em volume que caracterize intuito comercial, realize operações relativas à circulação de mercadorias ou preste serviços de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação (Lei 6.374/89, art. 7º, na redação da Lei 9.399/96, art. 1°, III)."
7. Portanto, depreende-se da leitura dos dispositivos acima que, como regra geral, se considera fato gerador do imposto a saída física de mercadoria e é contribuinte aquele que promove sua circulação.
8. Isso posto, é importante ressaltar que a Consulente se equivocou quando informou que a resposta à Consulta 18.581/2018 tratou de operação de venda à ordem de cana-de-açúcar. Em verdade, tal resposta tratou de operação em que o interessado adquiria a safra da cana-de-açúcar em pé e, em seguida, promovia sua venda à usina, que, por sua vez, efetuava o corte da cana-de-açúcar e transporte para o seu próprio estabelecimento industrial. Ou seja, essa resposta tratou do mesmo assunto objeto de indagação na presente consulta que, pelos mesmos motivos, não se refere à operação de venda à ordem, mas sim venda de plantação de cana-de-açúcar.
9. Tal fato é relevante e altera substancialmente a operação praticada, tendo em vista que:
9.1. na hipótese de uma típica venda à ordem, ocorrem dois fatos geradores, quais sejam, a venda da cana cortada (mercadoria) do estabelecimento rural para a Consulente, e uma segunda operação de venda, da Consulente para a usina;
9.2. na hipótese em que a safra de cana-de-açúcar em pé é adquirida pela Consulente e revendida à usina, há apenas um fato gerador do imposto, no caso, a remessa da cana-de-açúcar cortada do estabelecimento rural para a usina, posto que a usina promoverá o corte da cana-de-açúcar e transporte para o seu próprio estabelecimento industrial. Nessa situação, como veremos, é irrelevante, para fins do ICMS, o acordo prévio realizado entre a Consulente a usina.
10. Conforme disposto no artigo 79 do Código Civil de 2002, são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. Logo, o que estiver plantado no solo, o que inclui a cana-de-açúcar, constitui bem imóvel, motivo pelo qual a sua venda não caracteriza circulação de mercadoria. Assim, não há incidência do ICMS na venda de cana-de-açúcar plantada no solo (cana-de-açúcar em pé), uma vez que o fato gerador do ICMS, segundo prevê o inciso I do artigo 1º do RICMS/2000, é a operação relativa à circulação de mercadorias. Por essa razão, a compra da safra de cana-de-açúcar em pé pela Consulente, e a posterior venda à usina, antes do corte, não caracterizam hipóteses de incidência do ICMS, não gerando obrigações tributárias relativas ao imposto.
11. Por outro lado, a usina, após a compra da cana-de-açúcar em pé, realizará seu corte e efetuará o transporte para o seu estabelecimento industrial, promovendo, assim, a saída da mercadoria (cana-de-açúcar cortada), o que configura fato gerador do ICMS. Logo, nessa hipótese, é a usina a responsável pelo cumprimento das obrigações fiscais (principal e acessórias) relativas às operações sujeitas ao ICMS, e não a Consulente, tampouco o estabelecimento rural.
12. Assim, como a venda da cana-de-açúcar em pé não constitui fato gerador do ICMS, não há obrigações fiscais a serem cumpridas em relação a esse imposto pela Consulente, restando prejudicados os questionamentos por ela feitos. Cabe-nos registrar que a Consulente não tem a legitimidade de interesse para formular consulta em relação às obrigações que devem ser cumpridas por seus fornecedores ou clientes, devendo esses, em caso de dúvida, apresentar o devido questionamento a este órgão consultivo.
13. Registre-se, por oportuno, que tal entendimento já foi exarado em diversas oportunidades anteriores por esta Consultoria Tributária, a exemplo das respostas às consultas 933/2012, 13.225/2016, 17.804/2018, 18.199/2018, 18.581/2018, 19859/2019 e 27670/2023, todas disponíveis no site https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/Home.aspx.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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