Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.

Resposta à Consulta nº 28.668, de 22/01/2024

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 28668/2023, de 22 de janeiro de 2024.

Publicada no Diário Eletrônico em 24/01/2024

Ementa

ICMS - Industria gráfica - Industrialização de quadros - Operação comercial, pelo encomendante, de saída subsequente.

I. A despeito dos outros requisitos, para se configurar impresso personalizado, é condição essencial que o impresso não seja objeto de operação de circulação de mercadoria posterior. O impresso deve ser de uso exclusivo do encomendante.

II. A atividade de impressão gráfica, ainda que em papel, para produção de quadros a serem alienados, pelo encomendante ou por terceiro, a consumidores finais, é considerada industrialização, na modalidade de transformação. O produto resultante não será considerado impresso personalizado e a operação de saída ao encomendante é considerada operação de circulação de mercadoria, tributada por ICMS.

III. A operação subsequente de saída do produto pronto realizada pelo encomendante encontra-se sujeita à tributação por ICMS.

Relato

1. A Consulente, contribuinte enquadrado no Regime Periódico de Apuração e que dentre outras atividades econômicas declaradas no Cadastro de Contribuintes do ICMS - CADESP possui "atividades de intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral" (CNAE 74.90-1/04) e "comércio varejista de mercadorias em geral" (CNAE 47.12-1/00), ingressa com consulta sobre o modelo negocial que pretende adotar.

2. De início, a Consulente afirma que presta serviço de vitrine virtual (marketplace online). Nesse contexto, relata que presta serviço de intermediação entre os fornecedores e o consumidor final. No caso específico de venda de obras, informa que os fotógrafos e artistas que expõem suas obras no site da Consulente são contribuintes do ICMS, dado que as atividades destes é relacionada ao comércio.

3. Prossegue relatando que, após efetuada a venda das imagens para o consumidor final, a imagem digital comprada pelo consumidor final será enviada digitalmente para pessoas jurídicas terceiras que farão, dentre outros processos, a impressão e emolduramento das obras.

4. A Consulente, como expositora de venda do "quadro inteiro", e não apenas da imagem, informa que irá realizar a venda do "quadro inteiro". Diante disso, enviará o arquivo digital da arte para gráfica terceirizada pela Consulente, para que ela realize a impressão.

5. Ressalta que essa gráfica apenas presta serviço, que consiste na remessa da imagem já impressa para um terceirizado dela. Por sua vez, o terceirizado da gráfica fica encarregado pelo emolduramento, transformando aquela imagem impressa em um quadro físico pronto para ser entregue ao consumidor final.

6. Assim, apresenta dúvidas acerca das Notas Fiscais a serem emitidas: (i) do fotógrafo/artista para a Consulente, na qualidade de intermediadora e vitrine online; (ii) da gráfica para a Consulente, na qualidade de prestadora de serviços de impressão; (iii) da gráfica para empresa terceirizada, para fins de emolduramento da impressão.

7. Prossegue questionando quem e para quem deve emitir a Nota Fiscal de disponibilização de imagem e quem deve emitir a Nota Fiscal de venda do quadro pronto.

Interpretação

8. Preliminarmente, observa-se que a Consulente apresenta relato confuso e por vezes contraditório. Embora afirme que faz intermediação, aproximando os vendedores dos compradores, por meio da exposição de mercadorias em seu site, expressamente relata que irá efetuar a venda do quadro inteiro. Além disso, informa que os artistas/fotógrafos é que são os comerciantes, mas questiona quem fará a venda da mercadoria "quadro pronto" e quem fará a disponibilização da imagem digital, questionamentos esses não propriamente tributários, mas sim decorrentes do modelo de como o negócio da Consulente é estruturado e que, por consequência, definem a própria tributação.

8.1 Nesse sentido, para uma resposta mais conclusiva, a Consulente deveria trazer maior detalhamento possível do seu modelo negocial, preferencialmente juntando todos os contratos envoltos, quais sejam: da Consulente com os vendedores, da Consulente com os compradores, o contrato com a gráfica e da gráfica para com o terceirizado.

9. Não obstante a ausência de tais informações, em vista da complexidade da matéria, a presente consulta será respondida partindo-se da premissa que, de modo geral, a Consulente faz, de fato e de direito, serviço de intermediação de negócios, por meio da exposição de produtos de terceiros vendedores, em seu site na internet. Observa-se, no entanto, que essa premissa não tem o condão de validar a informação que a atividade da Consulente é intermediação de negócios. Recorda-se que a depender da situação fática e jurídica, e como o negócio é estruturado e apresentado, não se tratará de atividade de exposição de mercadorias de terceiros em site, mas sim atividade comercial da própria Consulente.

10. Nesses termos, registre-se que, a despeito de eventual atividade de exposição de mercadorias de terceiros, no modelo negocial descrito de venda de artes impressas, a Consulente acaba por ingressar na cadeia mercantil, assumindo a qualidade de vendedora do produto final ("quadro pronto"). Isso porque, do que se depreendeu do relato, a obrigação do fotógrafo/artista circunscreve-se à cessão digital da imagem (ainda que cedendo o direito de uso, mas sem transferência do direito de propriedade desta). No entanto, e sobretudo, do que também é possível depreender do relato, a Consulente assume a responsabilidade pela contratação da gráfica, e contratada em nome próprio, seria ela (Consulente) a destinatária primeira da mercadoria pronta (quadro), para que, em operação subsequente (ainda que o contrato de compra e venda seja anterior) esse quadro seja repassado a terceiro, adquirente e consumidor final do quadro.

11. Feitas essas considerações, passa-se, então, à análise da atividade da indústria gráfica, de acordo com os preceitos teóricos a respeito do tema.

12. Nesse sentido, vale destacar que a questão jurídica dos impressos personalizados gira em torno da correta delimitação do campo de incidência do ICMS, imposto de competência estadual, e do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), de competência municipal. Trata-se, portanto, de eventual conflito de competência tributária.

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13. Nos casos relacionados a supostos conflitos de competência tributária, esse órgão consultivo tem expedido o entendimento de que a Constituição Federal de 1988, em linhas gerais, repartiu entre os entes federativos a competência da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que a atividade se encontra: industrial (União); comercial (Estados e Distrito Federal); e prestação de serviços (Municípios e Distrito Federal).

14. Desse modo, a Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu artigo 155, inciso II, que aos Estados compete a tributação sobre as operações relativas à circulação de mercadoria e sobre a prestação dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação e, em seu artigo 156, inciso III, que aos Municípios compete a tributação sobre os serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, inciso II, e definidos em lei complementar.

15. Diante disso, dois requisitos mínimos são exigidos para que se considere determinada prestação de serviço abrangida pela competência municipal: (i) o serviço não pode estar compreendido no campo de incidência do imposto estadual; e (ii) o serviço deve estar previsto em lei complementar.

16. Nessa linha, observa-se que a Lei Complementar nº 116/2003 estabelece que o ISS tem como fato gerador a prestação de serviços constantes de sua lista anexa. No entanto, há de se ressaltar que a lista anexa à Lei Complementar e sua aplicação sobre o fato em concreto deve ser interpretada à luz da Constituição Federal, uma vez que, por óbvio, a legislação infraconstitucional não pode contrariar as disposições constitucionais.

17. Sendo assim, uma atividade essencialmente comercial, ainda que fornecida em conjunto com a prestação de serviço constante da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, não ser pode considerada como uma prestação de serviço tributável por ISS. Isso porque considerar uma atividade econômica essencialmente comercial como inserida no campo de competência municipal representaria um desvirtuamento do próprio texto constitucional, que expressamente insere a circulação de mercadoria no campo de competência estadual (ICMS).

18. Nesse prisma, para solucionar conflitos de competência tributária envolvendo a incidência de ICMS ou ISS quando o fornecimento de mercadoria a consumidor final ocorre em conjunto com prestação de serviço constante da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, conforme amparado por jurisprudência dos tribunais superiores, um dos critérios utilizados envolve a análise da preponderância entre o dar e o fazer. Assim, nos casos em que há a preponderância da obrigação de dar, a atividade imaterial prestada seria meramente acessória à obrigação de dar. Já para os casos em que há a preponderância do fazer, as mercadorias fornecidas são, na verdade, meros insumos utilizados para a consecução da atividade-fim do serviço.

18.1. Nesse ponto, recorda-se que, ainda que as partes tenham liberdade e autonomia para pactuar suas disposições contratuais, ao direito tributário não importa o nomen iuris contratual, mas sim o substrato econômico, isso é, o fato econômico subjacente ao contrato. Ou seja, os tributos não incidem, ipsis litteris, sobre o contrato tal como acordado (mera qualificação jurídica dada pelas partes), mas, sim, sobre a materialidade do fato econômico subjacente ao contrato e efetivamente praticado.

19. Não obstante o exposto, há ainda de se ressaltar que a mera análise de preponderância entre a obrigação de dar e fazer pode não se mostrar suficiente para dirimir os conflitos de competência tributária envolvendo o ICMS e o ISS.

20. Isso porque, conforme repartição de competência tributária sobre o consumo (item 13 acima), o ICMS incide sobre as "operações relativas à circulação de mercadorias", que fundamentalmente são aquelas operações que impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Ocorre que uma atividade essencialmente imaterial (obrigação de fazer) aplicada sobre uma mercadoria ou bem pode estar inserida no ciclo de produção e comercialização, atraindo a incidência de ICMS.

21. Assim, para além do critério de preponderância das obrigações de dar e fazer, a destinação da mercadoria ou bem sobre a qual eventual atividade imaterial é executada é elemento determinante para identificar a etapa do ciclo econômico em que essa atividade se localiza e, desse modo, é também um dos elementos fundamentais para se estabelecer a incidência do imposto competente. Nesse sentido, se a atividade imaterial é efetuada sobre mercadoria destinada a posterior comercialização, tratar-se-á de operação de circulação de mercadoria, sujeita ao ICMS (ainda que a atividade conste da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003); já se a atividade imaterial é efetuada sobre bem pertencente à usuário final, tratar-se-á de prestação de serviço, potencialmente sujeita ao ISS.

21.1. Com efeito, este entendimento não é novo e encontra guarida em decisões do Supremo Tribunal Federal, a exemplo das ADI nº 4.389/DF-MC, AI nº 803.296/SP-AgR e RE nº 606.960/ES-AgR.

21.2. A rigor, como exposto nestas decisões, para se definir a competência tributária, o primeiro critério a se utilizar é o da destinação do bem ou mercadoria sobre o qual a atividade é exercida. Havendo comercialização subsequente, tratar-se-á de processo industrial, portanto, operação de circulação de mercadoria, sujeita ao ICMS. Apenas em caso negativo, é que o conflito de competência será resolvido mediante a análise da preponderância entre as obrigações de dar e fazer.

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22. Foi mediante essa linha teórica exposta acima que a Decisão Normativa CAT-04/2015 foi elaborada e deve ser interpretada. Assim, a Decisão Normativa CAT-04/2015 sumarizou o entendimento acima exposto para os casos de impressos personalizados (publicitários ou não) promovidos pela indústria gráfica.

22.1. Portanto, considerando a exposição teórica acima, na atividade da indústria gráfica e sob a ótica da Decisão Normativa CAT-04/2015, a primeira análise a ser feita é se o impresso será objeto de nova operação de circulação de mercadoria (saída isolada, integrada a outros mercadorias, ou utilizada como insumo em processo industrial) - item 2 da Decisão Normativa CAT-04/2015.

22.2. Superada essa etapa, não havendo operação de saída para terceiros, deve-se analisar qual atividade prepondera: se atividade de desenvolvimento e impressão gráfica de materiais gráficos personalizados ou se atividade de circulação de mercadoria (industrialização - isso é, transformação, beneficiamento ou acondicionamento de material gráfico). Dessa forma, como exposto na referida Decisão Normativa CAT-04/2015, deve-se analisar eventual preponderância da obrigação de dar sob a ótica da personalização do impresso, bem como em razão do valor e natureza do material empregado, para assim se verificar se não se trata de efetiva industrialização de mercadoria.

23. Trazendo essas considerações para o caso em estudo, sequer é necessária a análise de eventual preponderância entre a obrigação de dar ou de fazer. Isso porque, do próprio relato da Consulente, é certo que haverá operação comercial de saída subsequente do produto resultante da indústria gráfica (quadro pronto).

23.1. Nesse ponto, vale recordar que a própria Consulente parece não ter dúvida que o objeto final comercializado é uma mercadoria, tanto que menciona que os fotógrafos e artistas exercem atividades comerciais e inclusive questiona quem, na situação em tela apresentada, deveria emitir Nota Fiscal de venda.

23.2. Assim, seja pela Consulente, seja por seu parceiro fotógrafo/artista, haverá a comercialização da mercadoria (quadro pronto), resultante da atividade de industrialização da indústria gráfica. Portanto, o produto resultante da indústria gráfica será objeto de nova operação de circulação de mercadoria (e não será de uso exclusivo do encomendante).

24. Desse modo, considerando a atividade da indústria gráfica apresentada, é incorreto o entendimento de que esta realiza prestação de serviço. Como visto, trata-se de efetiva atividade de fabricação de mercadoria (quadro pronto) encomendada pela Consulente (nos termos das premissas expostas) para comercialização. Assim, a indústria gráfica está praticando uma operação de circulação de mercadoria (sujeita à incidência do ICMS), industrializando-a, na modalidade de transformação (artigo 4º, inciso I, alínea "a", do RICMS/2000). Nesse sentido, observa-se que a atividade da indústria gráfica apresentada consiste em receber arquivos digitais e sobre a matéria prima adquirida executar certos processos transformando-a em novo produto (quadro), portanto, subsumindo-se ao conceito de transformação descrito na alínea "a" do inciso I do artigo 4º do RICMS/2000.

25. Isso posto, ressalta-se que o fato do processo industrial da indústria gráfica (emolduramento) ser repassado para terceiro, não desvirtua sua atividade industrial na modalidade de transformação. Na verdade, acentua. Com efeito, embora, ante a falta de maiores informações, não se possa detalhar os procedimentos a serem adotados nesse repasse de parte do processo industrial, fato é que a legislação paulista tem disciplina própria e específica para tanto, a saber: a disciplina de industrialização por conta de terceiros, normatizada no Estado de São Paulo pelos artigos 402 a 410 do RICMS/2000 e Portarias CAT nº 22/2007 e 151/2015. Assim, recomenda-se ao industrial parceiro da Consulente a observância dessas normas quando da remessa da mercadoria para emolduramento por terceiros e no posterior retorno (ainda que o quadro seja fisicamente enviado diretamente para Consulente ou para os terceiros adquirentes).

26. Cabe ainda reiterar que, na medida em que a Consulente contrata a indústria gráfica, tornando-se encomendante do produto resultante ("quadro pronto") acaba por ingressar na cadeia mercantil, assumindo a qualidade de agente mercantil da operação subsequente deste produto pronto (pouco importando se, para outros produtos que não a arte impressa, seja mera intermediária). Recorda-se que, como visto (item 20 acima), operações relativas à circulação de mercadorias tributáveis por ICMS são fundamentalmente aquelas que impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Nesse sentido, na medida em que a Consulente ingressa como encomendante de produto da indústria gráfica (fonte produtora) a ser alienado, por ela ou por terceiros a consumidor final, acaba por se inserir em etapa da cadeia de agregação de valor referente a circulação mercantil do produto. Isso é, encomenda a mercadoria da fonte produtora (indústria gráfica) e impulsiona a mercadoria encomendada diretamente para o consumidor final, ou em direção a ele.

27. Assim, a operação subsequente de saída do quadro pronto, a ser realizada pela Consulente, também está sujeita à tributação por ICMS, podendo observar, no entanto, as regras usuais de creditamento do imposto, referente à operação anterior de aquisição. E, por se tratar de saída de mercadoria, a Consulente deverá emitir Nota Fiscal nos termos do artigo 125 e seguintes do RICMS, com observância ainda da Portaria CAT 162/2008.

28. Por fim, ante falta de maiores informações, bem como por possivelmente não ser área de competência da legislação estadual, resta prejudicado o questionamento referente à emissão de Nota Fiscal pela disponibilização de imagem.

Nota:

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

Base Legal: Resposta à Consulta nº 28.668, de 22/01/2024.

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