Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.

Resposta à Consulta nº 25.621, de 29/07/2022

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 25621/2022, de 29 de julho de 2022.

Publicada no Diário Eletrônico em 01/08/2022

Ementa

ICMS - Construção de obra própria - Incorporação imobiliária - Estrutura produzida fora do local da obra pela própria incorporadora.

I. Na incorporação imobiliária, em que o incorporador produz estruturas para a construção fora do local da obra, destinadas a obra em terreno próprio ("obra própria") e cuja finalidade desta seja a de alienação de unidades autônomas, assumindo os riscos pela venda das unidades prontas, não há circulação de mercadoria tributável por ICMS.

II. As empresas dedicadas à atividade econômica de construção civil, embora, em regra, não se caracterizem como contribuintes do ICMS, estão sujeitas à inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS para o cumprimento das obrigações acessórias estatuídas na legislação tributária estadual. A obrigatoriedade da inscrição decorre da atividade material de execução de obra de construção civil.

III. Na movimentação de estruturas para a construção produzidas fora do local da obra por incorporador imobiliário quando destinados à obra própria, deve ser emitida Nota Fiscal com indicação dos locais de procedência e destino, constando "Simples Remessa" como natureza da operação (CFOP 5.949), em nome do próprio incorporador imobiliário direto, sem lançamento de débito ou crédito (artigo 4º, § 2º, do Anexo XI do RICMS/2000).

Relato

1. A Consulente, que tem como atividade principal a construção de edifícios (41.20-4/00) e diversas atividades secundárias - dentre elas a incorporação de empreendimentos imobiliários (41.10-7/00); outras obras de engenharia civil não especificadas anteriormente(42.99-5/99); e administração de obras (43.99-1/01) - apresenta consulta sobre a incidência do ICMS na sua operação.

2. A Consulente afirma fazer parte de grupo empresarial cuja atividade econômica precípua é a de incorporação imobiliária, que, em síntese, consiste na atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas por unidades autônomas, com foco em habitações populares. Registra que sua atividade é integralmente dedicada à construção de unidades residenciais populares.

3. Nesse contexto, informa que, embora o mercado atue com o modelo de constituição de sociedade de propósito específico destinada à edificação das unidades imobiliária autônomas, ela não se utiliza deste modelo negocial. A Consulente afirma que, no bojo de sua atividade, constitui o patrimônio de afetação dentro da própria entidade jurídica, segregando contabilmente as receitas e as despesas de cada empreendimento dentro da mesma entidade (cuja comprovação se encontraria no documento "Ata de Eleição da Comissão de Representantes do Empreendimento CRE", anexado pela Consulente).

4. Ainda, segundo a Consulente, a atividade de incorporação imobiliária, na prática, consubstancia-se pelo desenvolvimento de empreendimentos imobiliários, mediante a prospecção e aquisição de terrenos, desenvolvimento de projeto, realização de obras, por conta própria, em terrenos de sua propriedade, incorporação e registro das unidades imobiliárias, vendas, entrega dos imóveis incorporados, gerenciamento de recebíveis, isto é, engloba todas as etapas necessárias para a consecução de um empreendimento imobiliário, assumindo todo o risco da atividade de venda de unidades imobiliárias.

5. Nesse plano, acrescenta ser a empresa do grupo que se utiliza de novo método construtivo (construçãooffsite), para a edificação de casas, por conta própria, em terrenos de sua propriedade, destinadas à comercialização na forma de unidades imobiliárias autônomas. Explica que o modelo de construçãooffsitese caracteriza pela construção de casas preparadas fora do local da obra mediante utilização da tecnologia construtiva denominadawoodframe. Assim, a atividade de construção se inicia em estabelecimento da Consulente com a elaboração de painéis dewoodframeconstituídos precipuamente de madeira Pinus (oriundos de reflorestamento) e conclui-se com a montagem da casa feita com as referidas estruturas, no terreno destinado à localização da unidade imobiliária autônoma.

6. Informa que o maquinário utilizado na preparação das estruturas dewoodframeencontra-se no centro de construçãooffsiteda Consulente em São Paulo e a etapa subsequente da implantação do modelo consiste na implantação de outra planta (em cidade e Estado a serem definidos), destinada à serraria e ao tratamento da madeira utilizada, no centro de construção da Consulente, na preparação das estruturas dewoodframe.

7. A construçãooffsite, segundo a Consulente, parte do conceito de verticalização, em que a empresa internaliza toda a cadeia de valor da atividade imobiliária. O modelo consiste na preparação de estruturas pré-elaboradas de madeira, destinadas à construção de casas, fora do canteiro da obra, com a subsequente montagem destas estruturas, acompanhada de ajustes finais de acabamento, no próprio local da obra.

7.1. Para tanto, a atividade da empresa englobaria todo o processo de preparação e utilização de estruturas de madeira pré-elaboradas, tecnicamente denominadaswoodframe, desde a aquisição, serraria e tratamento das toras de madeira utilizada na elaboração dessas estruturas até a sua aplicação nas obras próprias, realizadas em terrenos de sua propriedade.

7.2. As toras de madeira seriam adquiridas por estabelecimento da Consulente localizadas no próprio Estado de São Paulo, onde seria realizado todo o processo de serraria e tratamento da madeira, preparando-as para a aplicação em processo destinado à criação das estruturas dewoodframe.

7.3. O produto desse processo seria remetido para outro estabelecimento da Consulente, onde ocorreria a elaboração das estruturas dewoodframe.

7.4. Após a realização do processo de preparação, a estrutura pré-elaborada dewoodframeseria destinada aos terrenos de propriedade da Consulente onde a própria Consulente realiza as obras, por conta própria, para construção de unidades imobiliárias autônomas.

7.5. Uma vez concluídas as obras e todo o restante do processo de incorporação imobiliária necessário para o desenvolvimento dos empreendimentos imobiliários da Consulente, ela entregaria as unidades imobiliárias prontas aos seus clientes.

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8. Como consequência, expõe seu entendimento no sentido que a Consulente:

8.1. Realizaria exclusivamente a atividade de incorporação imobiliária, assumindo o risco pela venda da unidade imobiliária autônoma;

8.2. O único produto comercializado na sua atividade econômica seria a unidade imobiliária autônoma, não abrangida pelo campo de incidência ICMS;

8.3. As obras necessárias para a consecução dos empreendimentos imobiliários seriam realizadas pela própria Consulente, por sua conta e risco, e ocorreriam exclusivamente em seus terrenos;

8.4. A Consulente não prestaria serviços de construção civil a terceiros;

8.5. Os materiais preparados e remetidos entre os estabelecimentos da Consulente destinados à construção das unidades imobiliárias autônomas, para seu exclusivo uso, em favor próprio, não consistem em mercadorias, mas tão somente bens em operações destituídas de qualquer caráter mercantil e sem circulação econômica.

8.6. A remessa de materiais será realizada, num primeiro momento, para obras localizadas no Estado de São Paulo e, num momento subsequente, para obras localizadas em outros Estados (isto é, remessas internas e interestaduais de materiais destinados à execução de obras

9. Afirma que não comercializará a madeira tratada, nem as estruturas dewoodframe, por isso entende que não haverá ato mercantil com conteúdo econômico quando da remessa de materiais produzidos pela Consulente para outros estabelecimentos de sua titularidade ou para a localidade de suas obras próprias. Afirma que a atividade econômica da empresa permanecerá sendo exclusivamente a incorporação imobiliária (incorporação de unidades imobiliárias autônomas em forma de casas). Com isso, a própria Consulente consumiria os materiais por ela elaborados na sua atividade de incorporação imobiliária, empregando-os na construção de imóveis próprios.

10. Segue informando que o artigo 2º do Anexo XI do RICMS/2000 dispõe sobre a não incidência de ICMS em determinadas operações, sem, no entanto, nada dispor a respeito das operações realizadas pelas empresas de incorporação imobiliária que decidem verticalizar todo o ciclo de construção, preparando o tipo de estrutura objeto da presente consulta fora do local da obra e os empregando em obras próprias, como a Consulente.

11. Expõe seu entendimento no sentido de que o fato de preparar parte relevante do material empregado nas obras para construção das unidades imobiliárias autônomas não os torna mercadorias, à medida que não são objeto de mercancia, em momento algum da cadeia de produção, dado que o único produto comercializado pela Consulente permaneceria sendo a unidade imobiliária autônoma, que está fora do campo de incidência do ICMS.

12. Acrescenta que, não obstante as toras de madeira sofrerem processo de corte em serraria e tratamento, resultando em madeira tratada própria para o emprego no processo de elaboração das estruturas dewoodframedestinadas à construção de unidades imobiliárias autônomas, de propriedade da Consulente, como ela não pratica atividade comercial com esses materiais (madeira tratada e estruturas dewoodframe), não é contribuinte do ICMS e suas operações não estão no campo de incidência desse imposto.

12.1. Por isso, entende que as remessas realizadas entre os estabelecimentos de titularidade da Consulente, e entre eles e seus terrenos, de bens preparados e posteriormente empregados na construção de unidades imobiliárias autônomas próprias, não estão sujeitas à incidência do ICMS, porque tais operações são desprovidas de conteúdo econômico autônomo.

13. Cita também o artigo 9° do RICMS/2000, que, com fundamento no artigo 4º da Lei Complementar n° 87/1996 ("Lei Kandir"), esclarece que somente é contribuinte do ICMS a pessoa que realize circulação de mercadorias ou bens com intuito comercial, ainda que sem habitualidade, especificando as únicas exceções a essa regra em seu artigo 10°, entre as quais não se encontra a remessa de materiais para emprego em processo em estabelecimento próprio, cujo produto será destinado à obra própria, motivo pelo qual a Consulente entende que não reúne as condições de contribuinte de ICMS, dado que prepara e emprega materiais em obra de seu próprio empreendimento, sem realizar a transferência de propriedade desses materiais para terceiros em nenhuma etapa da sua atividade econômica.

14. Faz menção às respostas às consultas tributárias nº 18.461/2018 e nº 22.675/2020 as quais, segundo a Consulente, apresentaram conclusões no mesmo sentido do entendimento da Consulente, reforçando a sua correta interpretação da norma tributária.

15. Afirma também que, por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade ("ADC") 49, o Plenário do Supremo Tribunal Federal ("STF") declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Complementar no 87/1996 ("Lei Kandir") que preveem a ocorrência de fato gerador do ICMS na transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte

16. Por último, expõe seu entendimento sobre a inaplicabilidade da parte final do item 7.02 da lista de serviços anexa à Lei Complementar no 116/2003 (permite a incidência de ICMS sobre o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços) à sua atividade, uma vez que pretende desenvolver empreendimentos imobiliários, mediante a execução de obras próprias, em terrenos de sua propriedade, não tendo essa atividade relação alguma com as prestações de serviços relacionadas à construção civil.

17. A Consulente pergunta, resumidamente, o seguinte:

17.1. se está correto seu entendimento no sentido de não ser contribuinte do ICMS, não estando, portanto, sujeita ao ICMS a remessa de bens produzidos pelos estabelecimentos da Consulente entre si e entre estes e seus terrenos, destinados a obras próprias;

17.2. se nas remessas desses materiais entre estabelecimentos de titularidade da Consulente devem ser emitidas notas fiscais constando "Simples Remessa" como natureza da operação (operações internas: CFOP 5.949 e operações interestaduais: CFOP 6.949), sem destaque de ICMS; e

17.3. se está sujeita à inscrição no CADESP e à observância das demais obrigações fiscais acessórias.

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Interpretação

18. Inicialmente, cabe ressaltar que apresente resposta adotará como premissa que a Consulente adota em seu modelo negocial apenas patrimônio de afetação (não se valendo de sociedade de propósito específico) e que sua a operação se caracteriza, de fato, como construção de obra própria e em terreno de sua propriedade.

19. Ademais, adota-se também como premissa que as movimentações das estruturas analisadas nesta resposta são restritas a estabelecimentos da Consulente, não sendo aplicável à eventual movimentação de materiais entre pessoas jurídicas distintas, ainda que pertençam e sejam controladas por uma mesma sociedade empresarial em comum.

20. Isso posto, cumpre informar o entendimento reiterado desta Consultoria Tributária no sentido de que estão contidas no campo de incidência do ICMS as operações que, circunscritas ao contexto empresarial, impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Tais operações implicam, geralmente, em uma "obrigação de dar" (a mercadoria), concomitantemente, ou não, a uma "obrigação de fazer".

21. Contudo, nos casos de incorporação, ainda que a atividade de construção seja realizada em vista de uma "obrigação de dar" futura (comercialização das unidades autônomas prontas), há de se destacar o entendimento pacífico desta Consultoria de que imóvel não é mercadoria. Diante disso, o incorporador não é contribuinte do ICMS, de modo que o ciclo de produção e comercialização das mercadorias encerra-se quando o incorporador asadquire (e, naturalmente, tal aquisição não gera direito ao crédito para o incorporador adquirente).

22. Assim, ainda que o incorporador produza materiais fora do local da obra, uma vez destinados à obra própria, a sua saída posterior será realizada em favor próprio, sem que se vislumbre um futuro terceiro na cadeia de produção e comercialização que possa se beneficiar dessa produção. Como visto, a próxima etapa de cadeia de agregação de valor configura uma obrigação de dar cujo objeto é um imóvel, que não se caracteriza como mercadoria. Assim, a saída de material produzido fora do local da obra por incorporador imobiliário com destino à obra própria não está sujeita à tributação pelo ICMS.

23. Feitas essas observações quanto à obrigação principal, passa-se à análise acerca do cumprimento das obrigações acessórias.

24. Nesse plano, observa-se de pronto que o entendimento reiterado desta Consultoria Tributária é o de que as empresas dedicadas à atividade econômica de construção civil, embora, em regra, não se caracterizem como contribuintes do ICMS, estão sujeitas à inscrição no CADESP para o cumprimento das obrigações acessórias estatuídas na legislação tributária estadual.

24.1. Recorda-se que as determinações legais para o cumprimento de obrigações acessórias decorrem do poder administrativo de controle sobre os administrados, em prol do interesse público, e independem de sua caracterização como contribuinte (artigo 22 do RICMS/2000).

25. Com efeito, do que se infere dos artigos 1º e 3º e, sobretudo, do § 2º do artigo 3º, todos do Anexo XI do RICMS/2000, a obrigatoriedade da inscrição está relacionada com a atividade material de executar obras de construção civil. Da inteligência desses dispositivos, aquele que executa a obra de construção acaba por movimentar materiais e, assim, no interesse da Administração tributária, está obrigado a inscrever-se, mesmo que não seja contribuinte do ICMS.

26. Sendo assim, o incorporador imobiliário que movimenta materiais destinados a obra em terreno de sua propriedade com a finalidade de posterior comercialização das unidades autônomas prontas está obrigado a inscrever-se no CADESP ainda que não se caracterize como contribuinte do ICMS (artigo 1º, caput, do Anexo XI do RICMS/2000). Dessa forma, por força artigo 498 do RICMS/2000, deverá cumprir todas as obrigações acessórias exigidas dos contribuintes, inclusive em relação à emissão de documentos fiscais, valendo-se, todavia, do regramento específico previsto para empresas de construção civil, constante do Anexo XI do RICMS/2000.

27. Portanto, no caso em tela, em que há movimentação de estruturas pré-elaboradas de madeira produzidas fora do local da obra pelo próprio incorporador imobiliário, responsável pela execução da obra própria, quando destinados à obra própria, deve ser emitida Nota Fiscal com indicação dos locais de procedência e destino, constando "Simples Remessa" como natureza da operação (CFOP 5.949/6.949), no próprio nome da empresa construtora (incorporador imobiliário direto), sem lançamento de débito ou crédito, conforme artigo 4º, § 2º, do Anexo XI do RICMS/2000.

28. Com esses esclarecimentos, consideramos respondidos os questionamentos da Consulente.

Nota:

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

Base Legal: Resposta à Consulta nº 25.621, de 29/07/2022.

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