Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Disponibilizado no site da SEFAZ em 10/06/2020
ICMS - Aquisição de combustível para doação a órgão do Estado em virtude de estado de calamidade pública - Remessa efetuada pela distribuidora diretamente ao donatário - Venda à ordem - Isenção - Crédito - Ressarcimento.
I. É possível a aplicação do procedimento de venda à ordem, descrito no artigo 129 do RICMS/2000, ainda que a operação entre o adquirente original e o destinatário final seja realizada a título de doação.
II. Aplica-se a isenção prevista no artigo 83 do Anexo I do RICMS/2000 à doação de mercadorias a entidade governamental ou a entidade assistencial reconhecida como de utilidade pública, para assistência a vítimas de calamidade pública declarada por ato de autoridade competente.
III. O adquirente original poderá solicitar ressarcimento referente à parcela do imposto retido relativo ao valor acrescido, considerando que a operação subsequente é amparada por isenção, nos termos do inciso III artigo 269 do RICMS/2000, conforme procedimento estabelecido pela Portaria CAT-42/2018.
IV. É permitido ao adquirente original do combustível (substituído) se creditar e manter o crédito referente à aquisição de combustível com o imposto anteriormente retido por substituição tributária, conforme disposto no artigo 271 do RICMS/2000, tendo em vista que a isenção aplicável à operação subsequente de doação permite o aproveitamento do crédito.
1. A Consulente, que tem como atividade principal a "fabricação de produtos do refino de petróleo" (Código 19.21-7/00 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE), relata que, em apoio às ações de combate a pandemia do COVID-19, pretende doar combustível para abastecer ambulâncias, veículos de transporte de médicos, além de hospitais públicos e filantrópicos vinculados às Secretarias Estaduais de saúde de todo país.
2. Para efetuar a doação, comprará gasolina e óleo diesel de distribuidora e mandará entregar em ponto de entrega vinculado ao Governo Estadual por sua conta e ordem.
3. Entende que, para operacionalizar a doação, poderá adotar, por analogia, o procedimento de venda à ordem, previsto no artigo 40 do Convênio S/N°, de 15 de Dezembro de 1970. Assim, propõe que os seguintes documentos fiscais sejam emitidos:
3.1. a Consulente deverá emitir Nota Fiscal de doação para o órgão estadual donatário, contendo as seguintes informações: como natureza da operação, a expressão "remessa em doação"; CFOP 5.910 (remessa em bonificação, doação ou brinde); CST 40 (isento); no campo de informações adicionais de interesse do fisco: "mercadoria isenta de ICMS em função do estado de calamidade pública - Convênio ICMS 26/1975";
3.2. a distribuidora, localizada no Estado de São Paulo, deverá emitir Nota Fiscal de remessa por conta e ordem em nome do órgão estadual donatário, para acompanhar o transporte do produto, sem destaque do ICMS, indicando, além dos requisitos exigidos: como natureza da operação, a expressão "Remessa por conta e ordem de terceiros"; CFOP 5.923 (remessa de mercadoria por conta e ordem de terceiros, em venda à ordem ou em operações com armazém geral ou depósito fechado); CST 41 (não tributada); nos campos "documentos referenciados" e "dados adicionais" da NF-e, o número, a série e a data da Nota Fiscal emitida pela Consulente;
3.3. a distribuidora deverá emitir Nota Fiscal de venda para a Consulente, indicando, além dos demais requisitos exigidos: como natureza da operação "remessa simbólica - venda à ordem"; CFOP 5.119 (venda de mercadoria adquirida ou recebida de terceiros entregue ao destinatário por conta e ordem do adquirente originário, em venda à ordem); CST 60 (ICMS cobrado anteriormente por substituição tributária); no campo de dados adicionais da NF-e o número, a série e a data da Nota Fiscal emitida para a remessa do produto.
4. Considerando a previsão legal de manutenção do crédito do imposto nas doações a entidades governamentais, para assistência a vítimas de calamidade pública, disposta no parágrafo único do artigo 83 do Anexo I do RICMS/2000, entende que poderá efetuar e manter o crédito de ICMS correspondente à aquisição de combustível com o imposto anteriormente retido por substituição tributária, calculando o crédito mediante aplicação da alíquota interna sobre a base de cálculo que seria atribuída à operação própria do remetente, caso estivesse submetida ao regime comum de tributação.
5. Diante do exposto, questiona se está correto seu entendimento em relação à possibilidade de adotar, por analogia, o procedimento de venda à ordem na hipótese de doação de mercadoria e em relação ao procedimento de tomada e manutenção do crédito de ICMS, conforme item anterior.
6. Inicialmente, vale destacar que essa resposta adota o pressuposto de que a distribuidora adquire o combustível já com ICMS cobrado anteriormente por substituição tributária, considerando que, nos termos do inciso II do artigo 412 do RICMS/2000, a responsabilidade pela retenção antecipada do imposto sobre as operações subsequentes com combustíveis líquidos derivados do petróleo é atribuída ao fabricante. Dessa forma, a distribuidora (que, nos próprios termos do relato, emite Nota Fiscal com a indicação do CST 060 - ICMS cobrado anteriormente por substituição tributária) representa o primeiro contribuinte substituído da cadeia de circulação da mercadoria, e a Consulente, o segundo substituído.
7. Isso posto, frise-se que a operação de "venda à ordem" ocorre quando um estabelecimento contribuinte do imposto (adquirente original) adquire mercadoria de um determinado fornecedor (vendedor remetente) e, antes mesmo de recebê-la, promove a venda a terceiro (destinatário final), qualificado como o efetivo destinatário da mercadoria.
8. Na operação de venda à ordem cada um dos estabelecimentos envolvidos (fornecedor, adquirente original e destinatário final) deve ser distinto. Seus procedimentos fiscais têm como fundamento o artigo 40 do Convênio S/Nº, de 15/12/1970 e artigo 129, §§ 2º e 3º do RICMS/2000.
9. Registre-se que a saída de mercadoria, a qualquer título, do estabelecimento de contribuinte, é operação relativa à circulação de mercadoria, de modo que enseja a incidência do ICMS, ocorrendo o fato gerador no momento da citada saída e a base de cálculo do imposto será o valor da operação (artigo 2º, inciso I c/c artigo 37, inciso I, ambos do RICMS/2000).
10. Nesse sentido, como temos três pessoas jurídicas distintas envolvidas na situação e, ainda, como tanto na operação efetuada pelo fornecedor como na operação efetuada pelo adquirente original (Consulente) há circulação de mercadoria, sujeita à incidência do ICMS, não há óbice a que se aplique o procedimento relativo à "venda à ordem", descrito no artigo 129 do RICMS/2000.
11. Dessa forma, o procedimento descrito pela Consulente no item 3, de acordo com o artigo 40 do Convênio S/N°, de 15 de Dezembro de 1970 e artigo 129, §§ 2º e 3º do RICMS/2000, é adequado para a operação de doação pretendida.
12. Em continuidade, destaca-se que a operação de doação realizada pela Consulente poderá estar ao abrigo da isenção prevista no artigo 83 do Anexo I do RICMS/2000, se atendidos os requisitos nele estabelecidos: (i) saída de mercadoria em decorrência de doação; (ii) destinada a entidade governamental ou a entidade assistencial reconhecida como de utilidade pública e que atenda aos requisitos previstos no artigo 14 do Código Tributário Nacional, portadora do "Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos" fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social; (iii) para fins de assistência a vítimas de calamidade pública declarada por ato de autoridade competente:
"Artigo 83 (VÍTIMAS DE CALAMIDADES - DOAÇÃO) - Saída de mercadoria em decorrência de doação a entidade governamental ou a entidade assistencial reconhecida como de utilidade pública e que atenda aos requisitos previstos no artigo 14 do Código Tributário Nacional, portadora do "Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos" fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social, para assistência a vítimas de calamidade pública declarada por ato de autoridade competente, bem como a prestação de serviço de transporte daquela mercadoria (Convênio ICM-26/75, com alteração do Convênio ICMS-58/92, e Convênios ICMS-39/90 e ICMS-151/94, cláusula primeira, VI, "g").
Parágrafo único - Não se exigirá o estorno do crédito do imposto relativo à mercadoria beneficiada com a isenção prevista neste artigo."
13. Importante anotar que a operação pretendida pela Consulente apresenta certas peculiaridades, uma vez que além de ser realizada nos moldes da venda à ordem, envolve uma doação com permissão de manutenção do crédito, realizada pelo segundo substituído da cadeia de circulação da mercadoria. Ou seja, a operação final a ser realizada pela Consulente, que já tivera seu imposto retido pelo substituto tributário considerando a carga tributária total da cadeia, realizar-se-á ao abrigo da isenção (desde que observadas as condições previstas no artigo 83 do Anexo I do RICMS/2000), cuja legislação permite, adicionalmente, o aproveitamento do crédito referente à aquisição.
14. Logo, alguns procedimentos devem ser observados para a correta tributação da operação pretendida. Em primeiro lugar, observa-se que o inciso III do artigo 269 do RICMS/2000 determina que o estabelecimento do contribuinte substituído que tiver recebido mercadoria ou serviço com retenção do imposto poderá ressarcir-se da parcela do imposto retido relativo ao valor acrescido, referente à saída que promover ou à saída subsequente amparada por isenção ou não-incidência. Tal parcela, nos termos da alínea "b" do § 4º do mesmo dispositivo, representa o valor resultante da aplicação da alíquota interna sobre a diferença entre a base de cálculo da retenção e o valor da base de cálculo que seria atribuída à operação própria do contribuinte substituído que a estiver promovendo, caso estivesse submetida ao regime comum de tributação.
15. Portanto, ao promover a doação sob o abrigo de benefício isentivo, a Consulente fará jus ao ressarcimento do imposto anteriormente cobrado sobre a sua operação própria. Esclarecemos que atualmente a forma para se obter esse ressarcimento encontra-se disciplinada pela Portaria CAT-42/2018. Nesse sentido, ressaltamos a importância da distribuidora (primeiro substituído da cadeia) observar o disposto no § 3º do artigo 274 do RICMS/2000, tendo em vista a sistemática estabelecida nos §§ 4º a 7º do artigo 1º da referida portaria, de modo a permitir o ressarcimento do valor devido à Consulente.
16. Em relação ao direito ao aproveitamento do crédito correspondente à aquisição de combustível com o imposto anteriormente retido por substituição tributária, oportuna a transcrição no artigo 271 do RICMS/2000:
"Artigo 271 - O ressarcimento do valor do imposto retido ou da parcela do imposto retido, previsto no inciso IV do artigo 269 não impedirá o aproveitamento do crédito pelo contribuinte substituído, quando admitido, do imposto incidente sobre a operação de saída promovida pelo sujeito passivo por substituição, mediante lançamento no livro Registro de Apuração do ICMS, no quadro "Crédito do Imposto - Outros Créditos", com a expressão "Crédito Relativo à Operação Própria do Substituto" (Lei 6.374/89, art. 36, com alteração da Lei 9.359/96, art. 2º, I).
§ 1º - Na hipótese de a mercadoria ter sido recebida de outro contribuinte substituído, o valor do imposto incidente até a operação anterior será calculado mediante aplicação da alíquota interna sobre a base de cálculo que seria atribuída à operação própria do remetente, caso estivesse submetida ao regime comum de tributação.
§ 2º - O valor do crédito a que se refere o parágrafo anterior não poderá ser superior ao resultante da aplicação da alíquota interna sobre o valor da base de cálculo da retenção efetuada pelo sujeito passivo por substituição.
§ 3º - Na impossibilidade de identificação da operação de entrada da mercadoria, o contribuinte substituído poderá considerar o valor do crédito correspondente às entradas mais recentes, suficientes para comportar a quantidade envolvida."
17. Nota-se que o caput do dispositivo transcrito permite que, além do ressarcimento devido em decorrência da não ocorrência da tributação regular da operação subsequente realizada pelo substituído, o crédito referente à operação também seja aproveitado, quando admitido, sendo que na hipótese da mercadoria ter sido recebida de outro contribuinte substituído, o cálculo do valor a ser aproveitado deverá ser realizado nos termos do disposto nos §§ 1º e 2º.
18. Um ponto importante a ser esclarecido, contudo, é o fato do dispositivo em tela fazer menção, apenas, à hipótese do inciso IV do artigo 269 do RICMS/2000, qual seja, ressarcimento em decorrência do contribuinte substituído realizar operação interestadual. Nesse caso, o direito conjunto ao ressarcimento sobre a parcela retida referente à operação própria do segundo substituído e ao crédito que seria devido sobre a operação anterior tem o efeito prático de desfazimento da aplicação da substituição tributária, já que a operação efetivamente realizada pelo segundo substituído será novamente tributada à alíquota interestadual. Ou seja, o resultado final é a tributação pelas regras gerais do imposto, como se não tivesse ocorrido a substituição tributária.
19. Como regra, operações isentas ou não tributadas não conferem direito ao crédito relativo às operações anteriores (artigo 60, inciso I do RICMS/2000). Entretanto, como já exposto, o benefício do artigo 83 do Anexo I do RICMS/2000 confere expressamente esse direito ao contribuinte. Em uma situação hipotética na qual um contribuinte adquirisse mercadoria não sujeita à sistemática da substituição tributária (com o imposto destacado no documento hábil correspondente, portanto) e posteriormente realizasse operação sujeita à isenção com permissão de aproveitamento do crédito, o direito ao crédito permaneceria apesar de não haver débito na saída.
20. O mesmo raciocínio deve ser aplicado ao caso presente, o que nos leva à necessidade de interpretar o caput do artigo 271 do RICMS/2000 de forma sistemática com os demais dispositivos que regulam a matéria, notadamente o artigo 59 (não-cumulatividade do imposto), o artigo 60, inciso I (permissão para o aproveitamento do crédito de operações anteriores às isentas ou não tributadas, caso permitido) e o parágrafo único do artigo 83 do Anexo I (permissão para o aproveitamento do crédito na realização de doações destinadas ao atendimento de vítimas de calamidade pública), todos do Regulamento paulista do ICMS.
21. Dessa feita, assiste razão à Consulente quanto ao direito pelo aproveitamento do crédito que seria atribuído à operação anterior. E muito embora o artigo 271-A do RICMS/2000 possibilite que tal crédito seja apurado em conjunto com o ressarcimento do imposto devido de que tratam os artigos 269 e 270, o atual procedimento estabelecido pela Portaria CAT-42/2018 não contempla essa possibilidade. Assim, o aproveitamento do crédito pela Consulente, observadas as condições dos §§ 1º a 3º do artigo 271 do RICMS/2000, dar-se-á mediante lançamento no livro Registro de Apuração do ICMS, no quadro "Crédito do Imposto - Outros Créditos", com a expressão "Crédito Relativo à Operação Própria do Substituído", conforme caput desse mesmo artigo.
22. Diante de todo o exposto, consideramos dirimidas as dúvidas da Consulente.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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