Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Disponibilizado no site da SEFAZ em 28/04/2020
ICMS - Obrigações acessórias - Conserto, calibração e aferição em peças ou equipamentos - Industrialização por conta de terceiro, em mercadoria destinada à posterior comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda - Incidência.
I. A atividade de industrialização, em quaisquer das suas modalidades (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), se executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda, se sujeita à incidência somente do imposto estadual.
II. Haja vista a essencialidade da realização da aferição e calibragem dos produtos, a qual resultará no seu aperfeiçoamento, possibilitando assim a circulação da mercadoria na cadeia mercantil, nesta referida etapa (remessa e o retorno da mercadoria) são aplicáveis os procedimentos previstos nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.
III. A prestação de serviço, elencado no item 14.01 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003, sobre bem pertencente a usuário ou consumidor final, está sujeita ao ISSQN, com exceção das partes e peças empregadas, que se sujeitam ao ICMS.
1. A Consulente, optante pelo regime de tributação do Simples Nacional e que declara no Cadastro de Contribuintes do ICMS - CADESP o exercício da atividade de manutenção e reparação de aparelhos e instrumentos de medida, teste e controle (Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE 33.12-1/02), ingressa com consulta referente às suas prestações de serviço de conserto, constante do subitem 14.01 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003, em bem de usuário final e em peças que serão utilizadas como parte integrante de equipamento que posteriormente se destinará à comercialização.
2. Relata prestar serviços de calibração e aferição em equipamentos e ferramentas pertencentes a clientes usuários finais (ativo imobilizado ou material de uso do cliente) e em peças e equipamentos remetidos por clientes que os utilizarão como parte integrante (insumo) na fabricação de um produto que se destinará à venda.
3. Acrescenta que, na execução dos referidos serviços de calibração e aferição não ocorrerá transformação das características das peças e dos equipamentos remetidos e nem serão aplicadas partes e peças no referido serviço.
4. Descreve que a remessa da peça ou equipamento efetuada pelos clientes ocorre ao abrigo de Nota Fiscal sob o CFOP 5.915 ("remessa para conserto") e, após a prestação de serviço executada, a Consulente retorna a peça ou o bem utilizando o CFOP 5.916 ("retorno de conserto"), sendo que o serviço prestado é cobrado através da Nota Fiscal de Serviços Eletrônica - NFS-e, sob o código de serviços 14.01, com incidência do ISSQN.
5. Entende que as operações de remessa e retorno para conserto e manutenção de bem de uso do contribuinte (ativo imobilizado e material de uso e consumo) estão amparadas pela não incidência do ICMS, nos termos dos incisos IX e X do artigo 7º do RICMS/2000.
6. Diante do exposto, indaga:
6.1. Qual o CFOP que deve ser utilizado nos documentos fiscais que amparam a remessa e o retorno das peças e equipamentos remetidos para conserto (calibração e aferição), que fazem parte tanto do ativo imobilizado do cliente, como daqueles que serão utilizados como insumo na fabricação do produto do cliente remetente.
6.2. Sobre a prestação de serviço em análise, questiona se incide o ISS ou o ICMS.
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7. Preliminarmente, considerando que a Consulente não forneceu determinadas informações em seu relato, registre-se que a presente resposta adotará o pressuposto de que as operações tratadas na consulta são internas.
8. Feita essa consideração preliminar, depreende-se a ocorrência de duas situações distintas nas remessas efetuadas pelos clientes à Consulente: (i) a peça ou o equipamento pertencem ao contribuinte remetente sendo, portanto, bem de usuário final e, (ii) a peça ou o equipamento remetidos pertencem ao estoque do cliente e, após a intervenção realizada pela Consulente, serão utilizados como parte integrante de produto fabricado pelo remetente que o destinará à futura comercialização. Sendo assim, cabe inicialmente tecer algumas considerações teóricas sobre o tema.
9. Com efeito, é notório que a Constituição Federal, em linhas gerais, repartiu entre os entes federativos a competência da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que a atividade se encontra: industrial (União); comercial (Estados e Distrito Federal); e prestação de serviços (Municípios e Distrito Federal).
10. Nesse contexto, especificamente no que tange ao ICMS, ele incide sobre as "operações relativas à circulação de mercadorias", que fundamentalmente são aquelas operações que impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Tais operações implicam a "obrigação de dar" (a mercadoria), mas, no entanto, em algum momento da cadeia produtiva, pode surgir, concomitantemente ou não, uma "obrigação de fazer", sem que isso altere a natureza da operação.
11. Diante disso, a mesma atividade realizada - com ou sem emprego de materiais - pode constituir uma operação de industrialização voltada à mercancia (ICMS) ou uma prestação de serviço (ISSQN). Com efeito, o fato de determinada atividade constar na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 como prestação de serviço sujeita ao ISSQN, por si só, não inviabiliza que essa atividade seja, de fato e de direito, apenas uma etapa do ciclo de produção e comercialização da mercadoria e, dessa forma, estar sob a incidência do ICMS (artigo 2º, III, "a", do RICMS/2000).
12. Negar essa constatação e querer tributar por ISSQN o fornecimento de uma atividade, ainda que imaterial, envolta no ciclo produtivo, é ofender a não cumulatividade. Isso porque o imposto pago sobre o serviço seria agregado ao custo de produção e de comercialização subsequentes, onerando-o, sem a possibilidade de compensação, portanto, em nítido descompasso com o objetivo constitucional.
12.1. Além disso, não é razoável, ante as complexidades técnicas encontradas no ciclo produtivo, querer-se entender que a simples preponderância da atividade imaterial/intelectual, ou mesmo a produção personalíssima sob encomenda, seja um critério finito e único para a conceituação e definição de serviço para fins de incidência do ISSQN.
13. Sendo assim, a destinação da mercadoria sobre a qual é executada a atividade é elemento determinante para identificar a etapa do ciclo econômico em que essa atividade se localiza e, desse modo, é também um dos elementos fundamentais para se estabelecer a incidência do imposto competente.
14. Essa mesma linha de entendimento é atualmente seguida pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões sobre o tema de industrialização por encomenda, como pode ser observado das seguintes decisões: (i) AI nº 803.296/SP-AgR, transitado em julgado em 09/04/2019; e (ii) RE nº 606.960/ES-AgR, transitado em julgado em 16/12/2014 - cujas ementas são bastante elucidativas, motivo pelo qual transcreve-se os seguintes excertos:
"1. Em precedente da Corte consubstanciado na ADI nº 4.389/DF-MC, restou definida a incidência de ICMS "sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria.
2. A verificação da incidência nas hipóteses de industrialização por encomenda deve obedecer dois critérios básicos: (i) verificar se a venda opera-se a quem promoverá nova circulação do bem e (ii) caso o adquirente seja consumidor final, avaliar a preponderância entre o dar e o fazer mediante a averiguação de elementos de industrialização.
(...)
4. À luz dos critérios propostos, só haverá incidência do ISS nas situações em que a resposta ao primeiro item for negativa e se no segundo item o fazer preponderar sobre o dar." (AI nº 803.296/SP-AgR).
"3. Na industrialização por encomenda, se o bem retorna à circulação, tal processo industrial representa apenas uma fase do ciclo produtivo da encomendante, não estando essa atividade, portanto, sujeita ao ISSQN, como é o caso dos presentes autos." (RE nº 606.960/ES-AgR).
15. Nesse sentido, como visto acima, na industrialização por conta de terceiro, sequer é necessário analisar a preponderância entre o dar e o fazer, já que a industrialização por conta de terceiro é uma etapa do processo produtivo em que terceiro executa atividade em mercadoria alheia que posteriormente será comercializada ou se submeterá a outro processo de industrialização. Nesse caso, a industrialização por conta de terceiro se configura como etapa do processo de circulação de mercadoria e deve ser tributada pelo ICMS.
16. Nesse contexto, e a contrário senso, para se constituir fato gerador do ISSQN, o serviço prestado deve estar elencado na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003 e ser executado sobre bem pertencente a usuário ou consumidor final. Portanto, é pressuposto, para a incidência do ISSQN, tratar-se de bem de terceiro, ou seja, bem de propriedade de usuário ou consumidor final e não objeto de mercancia (mercadoria).
17. Feitas essas considerações teóricas, verifica-se, então, que as hipóteses informadas nos itens 8."i" e 8."ii" são situações fáticas distintas, cada qual com sua respectiva tributação. No primeiro caso, prestação de serviço em bem de usuário final (não posto à posterior mercancia), portanto, de competência tributária municipal (ISSQN). No segundo caso, como as partes e peças remetidas para conserto, aferição e calibragem serão integradas nos produtos fabricados pelo remetente, estes, postos à comercialização, verifica-se que a atividade da Consulente se encontra envolta no ciclo de produção e comercialização, tratando-se, portanto, de operação de industrialização voltada à mercancia, sujeita, assim, à competência tributária estadual (ICMS).
18. Dessa feita, na situação descrita no item 8."i", por se tratar de conserto, aferição e calibragem em bem de usuário final, tanto a remessa para conserto, com destino ao estabelecimento da Consulente, como o retorno ao cliente proprietário, estão abrangidas pela não incidência dos incisos IX e X, do artigo 7º do RICMS/2000 (saída e retorno de bens de uso do contribuinte para lubrificação, limpeza, revisão, conserto, restauração ou recondicionamento). Tais operações serão acobertadas pelos seguintes documentos fiscais:
18.1. Na remessa para conserto, aferição e calibragem, o cliente emite Nota Fiscal Eletrônica - NF-e consignando o CFOP 5.915 ("Remessa de mercadoria ou bem para conserto ou reparo"), sem destaque do imposto, anotando no campo "Informações Complementares" que se trata de uma "operação sem a incidência do imposto, nos termos do inciso IX do artigo 7º do RICMS/2000";
18.2. Por conseguinte, a Consulente, ao receber o bem remetido pelo cliente em virtude de conserto, aferição ou calibração, deverá escriturar a Nota Fiscal descrita no item 12.1 em seu livro Registro de Entradas, consignando o CFOP 1.915 ("Entrada de mercadoria ou bem recebido para conserto ou reparo"), não passível de creditamento tendo em vista remessa ao abrigo da não incidência nos termos do inciso IX do artigo 7º do RICMS/2000;
18.3. Efetuada a aferição ou calibragem, na Nota Fiscal que acoberta o retorno do bem ao cliente, deve ser informado o CFOP 5.916 ("Retorno de mercadoria ou bem recebido para conserto ou reparo"), sem destaque do ICMS, em razão da não incidência do artigo 7º, X, do RICMS/2000. Além disso, como a Consulente informa que não há emprego de partes ou peças na execução do conserto, aferição ou calibração do bem (que estariam afetas ao ICMS, conforme dispõe o artigo 2º, III, "b", do RICMS/2000 c/c subitem 14.01 da Lista de Serviços anexa à LC nº 116/2003), não há que se falar em tributação por ICMS sobre as partes e peças. Relativamente à prestação de serviço realizada, deve ser emitida Nota Fiscal de Serviços Eletrônica - NFS-e, incidindo o ISSQN.
19. Prosseguindo à hipótese informada no item 8."ii", conforme visto, verifica-se, nesse caso, que a intenção do cliente remetente é totalmente distinta daquela descrita no item 8."i", pois não ocorre uma prestação em bem de usuário final. Nessa hipótese do item 8."ii", a Consulente realiza aferição ou calibragem em mercadoria que, posteriormente, será comercializada, integrada a um produto a ser industrializado que se destina à venda.
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20. Nessa perspectiva, como visto, a realização da aferição, calibragem ou análises técnicas está no ciclo da operação relativa à circulação da mercadoria. Notadamente, o objetivo principal do cliente da Consulente é a efetivação da venda de seus produtos para terceiros. Essa atividade mercantil apresenta, como uma etapa essencial, a necessidade de se aferir/calibrar a qualidade dos produtos que, por fim serão destinados à venda (ainda que integrados em um equipamento). Por não possuir o instrumento voltado a este fim, o cliente remetente se utiliza de estabelecimento de terceiro (Consulente) para cumprir esta etapa e, assim, prosseguir no ciclo de comercialização de seus produtos. Nesse contexto, na medida em que serviços de aferição e calibragem dão origem a qualificações/certificações referentes à qualidade do produto, de certa forma, aprimora-o para o consumo.
21. Portanto, o processo de aferição e calibragem pode ser equiparado a um beneficiamento, o qual, na definição dada pelo Regulamento do ICMS - RICMS/2000, em seu artigo 4º, inciso I, alínea "b", é uma espécie de industrialização, consistindo em uma operação que importe em modificação, aperfeiçoamento ou, de qualquer forma, alteração do funcionamento, da utilização, do acabamento ou da aparência do produto.
22. Diante disso, haja vista o referido processo de aferição, calibragem e análises ser um processo de industrialização (do qual resultará o aperfeiçoamento dos produtos) e ter sido encomendado por terceiro, possibilitando assim a circulação da mercadoria na cadeia mercantil, na situação descrita pela Consulente, devem ser aplicados os procedimentos de industrialização por conta de terceiros previstos nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.
23. Explica-se, melhor. Da operação em tela, verifica-se que ocorre uma industrialização por conta de terceiros na qual, por opção do industrializador (no caso, o cliente remetente), uma etapa do processo produtivo é realizada por meio de serviço de um terceiro (Consulente). Esse serviço é executado sobre mercadoria (matéria prima ou produto intermediário) do encomendante, que, em etapa posterior, a comercializará (ou a submeterá a outro processo de industrialização).
24. Dessa feita, na situação prevista no item 8."ii", atendendo a disciplina elencada nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000, devem ser adotados os seguintes procedimentos:
24.1. Na saída da mercadoria (parte/peça) com destino ao estabelecimento da Consulente para que sejam efetuados os testes e análises - aferição e calibragem (espécie de beneficiamento) ficará suspenso o lançamento do ICMS incidente ("caput" do artigo 402 do RICMS/2000), devendo o cliente remetente (encomendante) emitir respectiva Nota Fiscal, sob o CFOP 5.901 ("Remessa para industrialização por encomenda"), informando a quantidade e a descrição dos produtos remetidos ao estabelecimento da Consulente, quem realizará a aferição ou calibragem;
24.2. No subsequente retorno ao estabelecimento do cliente encomendante, após a realização dos testes e análises (aferição ou calibragem) no estabelecimento da Consulente, também ficará suspenso o lançamento do ICMS relativamente aos produtos que foram remetidos para tal, lembrando que como condição da suspensão, o retorno ao estabelecimento do cliente encomendante deverá ocorrer dentro de 180 dias contados da data da saída da mercadoria de seu estabelecimento com destino àquele que procederá ao serviço de testes e análises, conforme preceituam os artigos 409 e 410 do RICMS/2000;
24.2.1. No retorno, considerando a informação dada pela Consulente, de que não há aplicação de outras partes ou peças, deverá ser emitida Nota Fiscal consignando o CFOP 5.902 ("Retorno de mercadoria utilizada na industrialização por encomenda"), pelo estabelecimento industrializador (Consulente);
24.2.2. Caso haja acréscimo de material, pelo industrializador, inclusive energia elétrica e combustíveis empregados no processo produtivo, ou seja, na realização dos testes e análises, tal material deve ser tributado no retorno ao estabelecimento do cliente encomendante, devendo ser acrescentado, na Nota Fiscal emitida pela Consulente, sob o CFOP 5.124 ("Industrialização efetuada para outra empresa");
24.2.3 Sob este mesmo CFOP 5.124 ("Industrialização efetuada para outra empresa") devem ser classificados os serviços prestados. Tratando-se de operações internas, em que tanto o estabelecimento autor da encomenda como o estabelecimento industrializador se localizam neste Estado de São Paulo, o imposto referente à parcela cobrada dos serviços de testes e análises (mão de obra) prestados pela Consulente fica diferido para o momento da efetiva saída dos produtos por ocasião da venda pelo cliente encomendante, conforme determina o artigo 1º, da Portaria CAT nº 22/2007.
25. Ante o exposto, caso a Consulente esteja procedendo de forma diversa à descrita nesta resposta, deverá procurar o Posto Fiscal de sua vinculação para regularizar a situação, ao abrigo do disposto no artigo 529 do RICMS/2000.
26. Por fim, a título meramente informativo, salienta-se que a Decisão Normativa CAT 13, de 24-8-2009, na forma ali analisada, concluiu pela aplicabilidade da suspensão prevista no artigo 402 do RICMS/2000 e do diferimento previsto na Portaria CAT nº 22/2007 para as empresas optantes do Simples Nacional que industrializam mercadorias sob encomenda de contribuinte paulista.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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