Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.

Resposta à Consulta nº 31.071, de 28/05/2025

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 31071/2024, de 28 de maio de 2025.

Publicada no Diário Eletrônico em 29/05/2025

Ementa

ICMS - Exportação indireta - Transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo titular situados em Estados distintos para posterior exportação - Remessa prévia a armazém geral.

I. As transferências nas quais não seja possível determinar previamente se as mercadorias transferidas serão vendidas no mercado interno ou exportadas não se caracterizam como remessas com fim específico de exportação para o exterior.

II. A remessa para armazém geral não alfandegado descaracteriza a remessa com fim específico de exportação, para efeito da previsão contida no parágrafo único do artigo 3º da Lei Complementar 87/1996 e no item 1 do parágrafo 1º do artigo 7º do RICMS/2000.

Relato

1. A Consulente, que exerce a atividade de comércio atacadista de defensivos agrícolas, adubos, fertilizantes e corretivos do solo (CNAE 46.83-4/00), relata que possui dois estabelecimentos no Brasil: sua matriz, situada no Estado do Mato Grosso, que tem por atividade econômica principal a fabricação de gelatina de pele bovina em pó, classificada no código 3503.00.19 da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), e seu estabelecimento filial localizado no Estado de São Paulo.

2. Informa que:

2.1. para a fabricação do referido produto, sua matriz adquire, de contribuintes de diversos Estados: matéria prima (pele bovina, inteira ou em pedaços), materiais secundários (ácido sulfúrico, soda cáustica e outros), mercadorias que se consomem no processo industrial (água, energia elétrica e vapor) e materiais de embalagem (geralmente sacos de papel kraft e big bags);

2.2. seu estabelecimento matriz exporta atualmente, ao abrigo da imunidade, a maior parte da sua produção de gelatina de pele bovina em pó, como regra geral, por meio de terminal alfandegado situado na zona primária do Porto de Santos, vendendo o restante no mercado interno, em operações interestaduais, tributadas pela alíquota de 12%, para os Estados de São Paulo (expressiva maioria), Minas Gerais e Goiás, e uma parcela ínfima em operações internas, tributadas pela alíquota de 17%;

2.3. por razões de natureza estratégica e operacional, sua matriz passará a se dedicar exclusivamente à fabricação e ao acondicionamento da gelatina de pele bovina em pó, transferindo toda a sua produção para seu estabelecimento paulista, que a remeterá para depósito em armazém geral paulista não alfandegado e realizará todas as operações de exportação e de venda no mercado interno;

2.4. a transferência de toda a produção da fábrica do Mato Grosso para a Consulente trará uma série de benefícios estratégicos e operacionais para a empresa, que reduzirá custos e otimizará significativamente sua logística.

3. Apresenta entendimento segundo o qual, conquanto a Lei Complementar 204/2023 não tenha revogado expressamente a expressão "ou outro estabelecimento da mesma empresa", contida na parte final do inciso I do parágrafo único do artigo 3º da Lei Complementar 87/1996, a vigência dessa expressão seria incompatível com a decisão do STF na ADC 49 e com as modificações introduzidas por aquela Lei Complementar, tendo havido a sua revogação tácita.

3.1. Diante disso, argumenta que às transferências interestaduais, inclusive àquelas com o fim específico de exportação, deveriam ser aplicadas as regras previstas na Lei Complementar 204/2023, no Convênio ICMS 178/2023 e, a partir de 1º/11/2024, no Convênio ICMS 109/2024 e no Decreto 69.127/2024 do Estado de São Paulo, de modo que o estabelecimento paulista da Consulente teria o direito de apropriar os créditos de ICMS relativos às transferências de gelatina de pele bovina em pó que receber de sua matriz mato-grossense, inclusive nas transferências recebidas com o fim específico de exportação.

4. De todo modo, entende que as transferências interestaduais de gelatina de pele bovina em pó, recebidas da sua matriz mato-grossense, não se caracterizam como saídas com o fim específico de exportação, mesmo que esse produto deva ser destinado à exportação para cliente no exterior, tendo em vista que as mercadorias recebidas em transferência de sua matriz serão remetidas, pela Consulente (depositante), para depósito em armazém geral paulista não alfandegado (depositário), estabelecimento que não se encontra entre os relacionados no parágrafo único do artigo 3º da Lei Complementar 87/1996, reproduzido no item 1 do parágrafo 1º do artigo 7º do RICMS/2000. Como esse rol é taxativo, afirma que, ainda que as mercadorias recebidas em transferência tenham como destino a exportação, esse fato, por si só, descaracterizaria, de plano, a saída (transferência) com o fim específico de exportação.

4.1. Afirma que, na esteira de reiteradas respostas desta Consultoria Tributária, a saída com o fim específico de exportação (indireta) tem que ser obrigatoriamente a operação que antecede a operação de exportação direta. No entanto, no caso aqui focalizado, haverá ainda duas outras operações entre elas: a de remessa, pela Consulente, para depósito em armazém geral paulista não alfandegado, e a de retorno do armazém geral para a Consulente, operações em que observará as normas previstas no Capítulo II do Anexo VII do RICMS/2000.

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5. Dado o exposto, solicita confirmação de seu entendimento, no sentido de que, observadas as regras previstas na Lei Complementar 204/2023, no Convênio ICMS 109/2024, no Decreto 69.127/2024 e nos artigos 59 e seguintes do RICMS/2000, poderá se creditar do ICMS destacado nas notas fiscais de transferências interestaduais de gelatina de pele bovina em pó, recebidas de sua matriz mato-grossense, inclusive quando as mercadorias sejam posteriormente destinadas à exportação para o exterior.

Interpretação

6. Inicialmente, cabe esclarecer que o entendimento constante em precedentes deste órgão consultivo (vide Respostas às Consultas Tributárias 2922/2014, 3410/2014, 5163/2015 e 5475/2015) é no sentido de que a entrada de mercadoria recebida de estabelecimento de mesmo titular localizado em outro Estado da Federação e cuja finalidade seja, de antemão, a de exportação, é caracterizada como "entrada de mercadoria recebida com fim específico de exportação", sendo de cumprimento obrigatório a disciplina relativa à remessa com "fim específico de exportação".

7. Ocorre, todavia, que, conforme consta do relato, nas transferências de mercadoria da matriz para o estabelecimento paulista da Consulente, não seria possível afirmar de antemão que as mercadorias se destinam à exportação, dado que parte não especificada destas mercadorias será vendida no mercado interno.

8. Desta forma, sendo o destino (mercado interno ou exportação) das mercadorias desconhecido antes do início da remessa, por não ser possível determinar previamente se as mercadorias transferidas serão vendidas no mercado interno ou exportadas, não há como se caracterizar essas operações como remessas com fim específico de exportação para o exterior, nos termos previstos no parágrafo único do artigo 3º da Lei Complementar 87/1996 e no item 1 do parágrafo 1º do artigo 7º do RICMS/2000.

9. Além disso, o texto do artigo 3º da Lei Complementar 87/1996, bem como do item 1 do parágrafo 1º do artigo 7º do RICMS/2000, é restritivo ao equiparar à exportação para o exterior às saídas de mercadoria apenas para: (i) empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; (ii) armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro.

10. Diante disso, a remessa prévia para armazém geral não alfandegado descaracteriza a remessa com fim específico de exportação, para efeito da previsão contida no parágrafo único do artigo 3º da Lei Complementar 87/1996 e no item 1 do parágrafo 1º do artigo 7º do RICMS/2000, uma vez que não se pode ampliar o rol de estabelecimentos destinatários previstos na legislação.

11. Nessa medida, não se pode afirmar que uma mercadoria depositada em armazém geral será necessariamente exportada, pois a partir dali ela poderá retornar ao estabelecimento remetente ou até mesmo ser remetida, por conta e ordem, para estabelecimento terceiro. Assim, o armazém geral não se confunde com armazém alfandegado, já que ambos possuem naturezas jurídicas distintas.

12. Pelo exposto, conclui-se que nas situações em que haverá trânsito da mercadoria por armazém geral, observadas as regras previstas na Lei Complementar 204/2023, no Convênio ICMS 109/2024, no Decreto 69.127/2024 e nos artigos 59 e seguintes do RICMS/2000, o estabelecimento paulista da Consulente pode se creditar do ICMS destacado nas notas fiscais de remessas interestaduais de gelatina de pele bovina em pó, recebidas de sua matriz mato-grossense em transferência, tendo em vista não se tratar de operação de remessa com fim específico de exportação para o exterior, nos termos do parágrafo único do artigo 3º da Lei Complementar 87/1996 e no item 1 do parágrafo 1º do artigo 7º do RICMS/2000,.

13. Por fim, cabe observar que, de acordo com o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, a autoridade fiscal tem competência para desconsiderar os atos e negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.

14. Consequentemente, quando verificada na situação concreta a utilização formal de atos e negócios jurídicos estruturados que sejam desprovidos de essência negocial ou, ainda, eivados de vícios para encobrir materialmente outros, de natureza diversa, para, assim, suprimir o real fato gerador da obrigação tributária, então, esses negócios poderão ser desconsiderados pela autoridade administrativa, para que haja a autuação de acordo com o fato gerador materialmente praticado.

Nota:

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

Base Legal: Resposta à Consulta nº 31.071, de 28/05/2025.
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