Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Publicada no Diário Eletrônico em 15/04/2024
ICMS - Prestação de serviço de assessoria ofertado em conjunto à comercialização de vinhos - Clube de Vinhos.
I.A operação de comercialização de vinhos desenvolvida conjuntamente com atividade de assessoria deverá ser tributada pelo ICMS.
1. A Consulente, que declara no Cadastro de contribuintes do Estado do ICMS (CADESP) como atividade econômica principal "comércio atacadista de bebidas não especificadas anteriormente" (CNAE 46.35-4/99) e como atividade secundária "comércio varejista de bebidas "(CNAE 47.23-7/00) apresenta dúvida quanto a interpretação da legislação sobre a venda de vinhos em conjunto com a prestação de assessoria sobre o assunto.
2. A consulente informa que faz comercialização para o Brasil inteiro de vinhos adquiridos no mercado interno ou através de importação.
3. Alega também que possui como produto, a assinatura de vinhos para clientes consumidores finais e que essa assinatura, indicada pela Consulente como "clube de vinhos", é formatada no modelo pré-pago, com pagamento à vista ou em 12 (doze) parcelas e que, através dessa assinatura, os clientes receberão vinhos com desconto e que poderão utilizar uma assessoria mensal. Dentro da alegada assessoria, poderá o assinante (cliente) ser assessorado quanto à temática de vinhos e aromas e receberá mensalmente, mensagens com notícias sobre temas e lançamentos de vinhos.
4. Acrescenta à narrativa que se trata de uma fidelização e que a assessoria mensal é prestada por um consultor, que efetua, de forma exclusiva para quem tem o plano de assinatura, uma prestação de serviços, uma curadoria individualizada, sendo que não ocorre a venda de mercadoria sem assessoria e ainda que o serviço está na lista dos serviços anexada à Lei Complementar 116/2003 (código 17.01 - Assessoria e consultoria de qualquer natureza).
5. Diante do exposto, questiona:
5.1. Se existe em São Paulo legislação específica para assinatura de vinho com assessoria.
5.2. Caso não exista legislação específica, qual o comportamento adotado pela Unidade Federativa com relação a venda de mercadoria com a prestação de serviços citada no item 3;
5.3. Se a operação é totalmente comercial, mesmo havendo consultoria mensal e não esporádica;
5.4. Se o que vale é a predominância e no caso da venda de vinhos com prestação de serviços embutidos haveria incidência do ICMS;
5.5. Se a receita da operação deve ser segregada com tributação de ISS e ICMS.
6. Informa que com base na Solução de Consulta SF/DEJUG 08/2019, o serviço prestado será identificado pelo objeto de cada contratação, independente da denominação dada ao serviço prestado, mas, tão somente, de sua identificação, simples, ampla, analógica ou extensiva com os serviços previstos na lista de serviços; sendo o serviço prestado em cada caso identificado pelo objeto de cada contratação.
7. Cabe no presente caso, antes de adentrarmos aos questionamentos efetuados pela Consulente, tecermos considerações teóricas sobre o tema.
8. Nos casos de supostos conflitos de competência tributária (como no caso relatado), esse órgão consultivo tem expedido o entendimento de que a Constituição Federal de 1988, em linhas gerais, repartiu entre os entes federativos a competência da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que a atividade se encontra: industrial (União); comercial (Estados e Distrito Federal); e prestação de serviços (Municípios e Distrito Federal).
9. Desse modo, a Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu artigo 155, inciso II, que aos Estados compete a tributação sobre as operações relativas à circulação de mercadoria e sobre a prestação dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação e, em seu artigo 156, inciso III, que aos Municípios compete a tributação sobre os serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, inciso II, e definidos em lei complementar.
10. Diante disso, dois requisitos mínimos são exigidos para que se considere determinada prestação de serviço abrangida pela competência municipal: (i) o serviço não pode estar compreendido no campo de incidência do imposto estadual; e (ii) o serviço deve estar previsto em lei complementar.
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11. Nesse sentido, observa-se que a Lei Complementar nº 116/2003 estabelece que o ISS tem como fato gerador a prestação de serviços constantes de sua lista anexa. No entanto, há de se ressaltar que a lista anexa à Lei Complementar e sua aplicação sobre o fato em concreto deve ser interpretada à luz da Constituição Federal, uma vez que, por óbvio, a legislação infraconstitucional não pode contrariar as disposições constitucionais.
12. Sendo assim, uma atividade essencialmente comercial, ainda que fornecida em conjunto com a prestação de serviço, não ser pode considerada, por inteiro, como uma prestação de serviço. Isso porque considerar uma atividade econômica essencialmente comercial como inserida no campo de competência municipal representaria um desvirtuamento do próprio texto constitucional, que expressamente insere a circulação de mercadoria no campo de competência estadual (ICMS).
13. Nesse prisma, para solucionar conflitos de competência tributária envolvendo a incidência de ICMS ou ISS quando o fornecimento de mercadoria a consumidor final ocorre em conjunto com prestação de serviço, conforme amparado por jurisprudência dos tribunais superiores, um dos critérios utilizados envolve a análise da preponderância entre o dar e o fazer. Assim, nos casos em que há a preponderância da obrigação de dar, a atividade imaterial prestada seria meramente acessória à obrigação de dar. Já para os casos em que há a preponderância do fazer, as mercadorias fornecidas são, na verdade, meros insumos utilizados para a consecução da atividade-fim do serviço.
14. Contudo, afora os casos de fornecimento de mercadoria em conjunto com prestação de serviço em que haja relação de dependência e, portanto, preponderância (e para os quais o deslinde do conflito é solucionado pela avaliação desta preponderância, como visto), há casos de fornecimento conjunto em que, embora a mercadoria e a prestação de serviço possam estar relacionadas, não há relação intrínseca de subordinação e dependência, prejudicando assim a avaliação da preponderância. Isso é, a relevância da obrigação de dar e fazer está em igualdade, de modo que a mercadoria fornecida tem relevância em si, assim como a prestação de serviço. A bem da verdade, no mais das vezes, nesses casos, trata-se de fornecimento de mercadoria e prestação de serviço autônomos entre si - ainda que o fornecimento em conjunto tenha razão negocial e seja amparado em um único instrumento contratual.
14.1. Nesse ponto, recorda-se que, ainda que as partes tenham liberdade e autonomia para pactuar suas disposições contratuais, ao direito tributário não importa o nomen iuris contratual, mas sim o substrato econômico, isso é, o fato econômico subjacente ao contrato. Isso é, os tributos não incidem, ipsis litteris, sobre o contrato tal como acordado (mera qualificação jurídica dada pelas partes), mas, sim, sobre a materialidade do fato econômico subjacente ao contrato e efetivamente praticado.
15. Feitas essas observações teóricas, passa-se a análise da situação fática apresentada pela Consulente. Nesse ponto, faz-se necessário ressaltar alguns pontos sobre as informações fornecidas pela Consulente e que serviram de base para a formulação das dúvidas apresentadas.
16.De forma preliminar, verifica-se que não procede a informação sobre a juntada da "imagem da assinatura/plano de vinhos", visto que nenhum documento foi anexado à presente consulta.
17. Ainda à título preliminar, cabe a relevante informação que a Consulente não possui CNAE atrelado à assessoria e/ou consultoria registrado junto às informações cadastrais obtidas no Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado de São Paulo (CADESP).
18. Dito isso, iniciaremos analisando a informação trazida pela Consulente que a atividade de assessoria consta na lista dos serviços anexada à Lei Complementar 116/2003 (código 17.01). Observa-se que isso, por si só, não inviabiliza que sua atividade seja, de fato e de direito, apenas uma etapa do ciclo de comercialização da mercadoria e, dessa forma, estar sob a incidência do ICMS (art. 2º, III, "a" do RICMS/2000).
19. Depreende-se da narrativa apresentada pela Consulente que a atividade de comercialização de vinhos pode ser acompanhada de uma assessoria que se dará através da aquisição pelo cliente de assinatura mensal para recebimento de vinho e de informações sobre as mercadorias adquiridas junto à Consulente.
19.1. A aquisição da "assinatura" permite ao cliente da Consulente receber vinhos com desconto e com uma assessoria mensal, sendo que essa última pode ser utilizada pelo cliente para obtenção de informações sobre temática de vinhos e aromas. Além disso, através da "assinatura" o cliente também recebe mensalmente, materiais como folders, mensagens com notícias sobre temas e lançamentos de novos vinhos.
20. Ainda pelo que se depreende do relato, não há indicação de que a assessoria se dará de forma apartada da entrega dos vinhos, sendo, portanto, ferramenta para, nos termos utilizados pela própria Consulente, "fidelizar o cliente".
21. Compreende-se, então, que a assinatura intitulada pela Consulente de "clube de vinhos" tem por objetivo o fornecimento de mercadorias (vinhos), ou seja, a obrigação de entregar/dar ao cliente uma quantidade mensal de garrafas de vinho cujas especificações poderão ser apresentadas ao destinatário final (cliente) pela Consulente, através de um "consultor" na forma de uma curadoria individualizada e; acompanhada de informações, mensagens, folders direcionados ao cliente sobre a temática vinhos.
22. Pelo exposto, compreende-se que o "clube de assinatura" é utilizado como atividade meio para a comercialização de vinhos, de tal feita que há subordinação e dependência da denominada "assessoria" em relação ao fornecimento das mercadorias (vinhos).
22.1. A assessoria indicada pela Consulente, caso venha a existir, não possui robustez independente, de tal sorte que necessita do comércio de mercadorias (vinhos) para que possa existir. O objetivo maior, senão o único, do adquirente na compra da assinatura, não é a obtenção de informações sobre os vinhos, mas o recebimento de mercadorias (vinhos).
22.2. Nesse ponto, importante reforçar que, aparentemente, nem existe o fornecimento de assessoria pela Consulente de forma independente, mas apenas em conjunto com o fornecimento de vinhos, no âmbito do "clube de vinhos".
23. A tempo, a Consulta SF/DEJUG 08/2019 referenciada pela Consulente trata de dúvida de contribuinte do ISS da cidade de São Paulo, sobre três tipos de contratos de prestação de serviços executados sem a concomitância com o fornecimento de mercadorias, de tal feita que a referida consulta não guarda analogia ou similaridade com a atual consulta, na qual existe a comercialização de mercadorias.
23.1. Ademais, conforme já discorrido no item 14.1, não interessa o nome dado ao contrato, o que importa é a essência obrigacional/material subjacente ao contrato e efetivamente praticado, o que no presente caso é a comercialização de mercadorias através de assinatura (clube de vinhos).
24. Em vista do relatado, entendemos que o "clube de assinatura" apresentado pela Consulente tem como principal atividade o fornecimento de produtos (vinhos), sendo que as atividades de assessoria são meramente acessórias. Como já foi dito, o intuito do cliente ao realizar a assinatura é adquirir vinhos e não contratar serviços de assessoria.
25. Ante o exposto, em resposta aos questionamentos 5.1 a 5.5, conclui-se que sobre a operação de comercialização de vinhos em conjunto com a assessoria, no âmbito da assinatura do "clube de vinhos", incide ICMS, sendo que a base de cálculo será o valor da operação (artigo 37, inciso I, RICMS/2000).
26. Nesses termos, consideram-se dirimidas as dúvidas apresentadas pela Consulente.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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