Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Publicada no Diário Eletrônico em 06/02/2023
ICMS - Incorporação de empresa - Direito ao aproveitamento dos créditos de ICMS existentes na escrita fiscal do estabelecimento incorporado - Continuidade operacional do estabelecimento incorporado.
I. Para a legislação do ICMS, não importa o modelo comercial adotado para a reestruturação da sociedade (cisão, fusão, incorporação, etc.), mas sim o que acontece de fato com o estabelecimento, não incidindo o imposto estadual quando o estabelecimento for transferido na sua integralidade (artigo 3º, inciso VI, da Lei Complementar nº 87/1996).
II. Na incorporação, quando o estabelecimento, de forma integral, permanecer em atividade no mesmo local, demonstrando haver continuidade operacional, os créditos existentes na respectiva escrita fiscal devem continuar válidos e passíveis de aproveitamento nesse estabelecimento sob a titularidade da empresa incorporadora.
III. A descontinuidade do estabelecimento ocorrida em razão do processo de incorporação configura encerramento das atividades do estabelecimento e, em razão do princípio da autonomia dos estabelecimentos, eventual outro estabelecimento que receba seus ativos não lhe sucede em sua escrita fiscal.
1. A Consulente, por meio de sua matriz estabelecida no Rio de Janeiro, declara exercer, como atividade principal a "fabricação de massas alimentícias" (CNAE 10.94-5/00) e relata que pretende efetuar uma operação de reorganização societária, por meio de processo de incorporação de empresa.
2. Informa que, na condição de incorporadora, alterará somente a titularidade do estabelecimento, continuando, no mesmo local, as atividades realizadas pelo estabelecimento, com os mesmos ativos e estoques, respeitando a continuidade da atividade operacional da empresa a ser incorporada.
3. Relata que o estabelecimento a ser incorporado possui saldo credor de ICMS devidamente registrado em sua escrita fiscal, saldo este que, no seu entendimento, poderão ser transferidos integralmente ao estabelecimento incorporador.
4. Em virtude dos procedimentos trazidos pela legislação do estado, (vide artigo 12, incisos I, alíneas "c" e "d", e III, alínea "b", do Anexo III da Portaria CAT-92/1998), a Consulente entende que haverá obrigatoriamente a efetivação da baixa na inscrição estadual onde encontram-se registrados os créditos fiscais de ICMS.
5. Ressalta que possui conhecimento que deverá solicitar a efetivação da migração dos créditos de ICMS através do Posto Fiscal e observar os procedimentos adequados para operacionalização da transferência do saldo credor para a escrita fiscal de seu novo titular.
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6. Face ao exposto, apresenta os seguintes questionamentos:
6.1. Está correto o entendimento quanto ao direito de transferência do crédito à incorporadora?
6.2. Qual é o devido processo e ou pedido de autorização formal a serem considerados pela empresa Consulente e a empresa incorporada para operacionalização da transferência de crédito de ICMS?
6.3. Quais são os procedimentos a serem obedecidos por parte das empresas incorporada e incorporadora? Existe alguma orientação legal específica não observadas pela empresa Consulente?
6.4. Há previsão expressa ou orientativa acerca da necessidade de emissão de Nota Fiscal eletrônica em modelo específico? Ou ainda, lançamento através de escrita fiscal por meio de ajustes/codificações identificadas escrituradas em obrigações acessórias vigentes?
6.5. Uma vez que autoridade fiscal estiver ciente da intenção da incorporação das atividades empresariais, e, hipoteticamente orientado o contribuinte sobre um possível processo e ou pedido de autorização, qual será o prazo máximo para efetivação da incorporação por parte da empresa Consulente?
7. De partida, cumpre registrar que, do relato apresentado é possível depreender que ocorrerá uma incorporação de empresa com transferência de titularidade de estabelecimento à nova titular incorporadora, continuando as atividades até então realizadas pela titular incorporada, permanecendo o estabelecimento no mesmo local, com os mesmos ativos, bens e estoques, ocorrendo, portanto, a transferência integral do estabelecimento.
7.1. Dessa forma, a presente resposta partirá do pressuposto de que ocorrerá a aquisição de empresa por incorporação, com transferência integral do estabelecimento à incorporadora (Consulente), alterando-se apenas sua titularidade, com continuidade de suas atividades no mesmo local, com os mesmos ativos, bens e estoques existentes.
8. Dito isso, relativamente ao processo de incorporação, como é de conhecimento da Consulente, este órgão consultivo tem expedido o entendimento de que os negócios jurídicos que envolvem transformação na natureza e na forma de sociedades não estão diretamente afetos às questões tributárias pertinentes ao ICMS, pois cuidam de questões civis, ligadas ao patrimônio social e não à circulação de mercadorias. Todavia, isso não significa que em todas as situações em que o patrimônio, integral ou parcialmente, passa de uma para outra empresa, nova ou preexistente, não haja situação que configure hipótese de incidência do ICMS.
9. Com efeito, a lógica estrutural do ICMS se paira pelo princípio da autonomia dos estabelecimentos. Desse modo, para a legislação do ICMS, não importa o que acontece com a empresa, isso é, com o modelo comercial adotado para a reestruturação da sociedade (cisão, fusão, incorporação, etc.), mas sim o que acontece de fato com o estabelecimento enquanto unidade autônoma.
10. O artigo 3°, inciso VI, da Lei Complementar nº 87/1996, estabelece que não incide o ICMS sobre operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de propriedade de estabelecimento industrial, comercial ou de outra espécie.
10.1. Note-se que, para que não incida o imposto, o estabelecimento, como unidade autônoma que é, deve ser transferido na sua integralidade, permanecendo íntegra a sua individualidade.
10.2. Portanto, a transferência integral de estabelecimento, ou seja, aquela na qual o estabelecimento, ainda que sob nova titularidade, continuará desenvolvendo as mesmas atividades, no mesmo local, com os mesmos ativos, os mesmos estoques, etc., é hipótese de transferência de titularidade de estabelecimento, conforme prevê o referido artigo 3º, inciso VI, da Lei Complementar nº 87/1996.
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11. Dessa feita, se o estabelecimento pertencente à empresa incorporada for transferido em sua totalidade para a empresa adquirente (Consulente), a qual passará a deter a sua respectiva titularidade, e que permanecerá exercendo a integralidade de suas atividades, no mesmo local, com todos os elementos que o integram para o exercício da atividade empresarial, estará, então, em consonância com os ditames do artigo 3º, inciso VI, da Lei Complementar nº 87/1996.
12. Sendo esse o caso, a mudança de titularidade deve ser comunicada à Secretaria da Fazenda e Planejamento (inciso I e parágrafo único do artigo 25 do Regulamento do ICMS - RICMS/2000).
13. Frise-se, ainda, que, quando o estabelecimento é transmitido na sua totalidade, sua individualidade permanece íntegra. Tanto que não haveria, em tese, a necessidade de se alterar a inscrição estadual dos estabelecimentos. A escrita contábil e fiscal do estabelecimento transferido poderia ser mantida integralmente sob a nova titularidade, podendo, ainda, se utilizar os mesmos livros e documentos, com as devidas adaptações (artigo 1º, inciso III, alínea "a", da Portaria CAT-17/2006). No entanto, em virtude dos procedimentos decorrentes do sistema de cadastro sincronizado de contribuintes da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo e da Receita Federal do Brasil, realizados eletronicamente, a alteração de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica do Ministério da Fazenda - CNPJ acarreta, necessariamente, alteração da Inscrição Estadual no correspondente Cadastro de Contribuintes do ICMS (vide artigo 12, inciso I, alíneas "c" e "d", e inciso III, alínea "b", do Anexo III da Portaria CAT-92/1998).
14. Dessa forma, não obstante as questões de sistemas e a baixa formal da inscrição estadual, fato é que, no processo de incorporação de empresa, sem alteração de outros elementos do estabelecimento, transfere-se apenas a titularidade do estabelecimento, que, como entidade autônoma, continuará exercendo normalmente sua atividade operacional, no mesmo local físico. Assim, se o estabelecimento anterior de titularidade da incorporada possuir créditos de ICMS em sua escrita fiscal, a empresa incorporadora terá direito a tais créditos na escrita fiscal desse mesmo estabelecimento transferido, pois, após incorporação, passam a pertencer a ela, visto que se tornará a nova titular do estabelecimento.
15. No entanto, como o estabelecimento terá um novo número de inscrição estadual, sugere-se, por cautela, que não sejam encerradas as atividades do estabelecimento incorporado antes de se obter a orientação necessária quanto aos créditos na escrita fiscal, considerando o disposto no inciso II do artigo 69 do RICMS/2000 ("ressalvadas disposições em contrário, é vedada a restituição ou a autorização para aproveitamento de saldo de crédito existente na data do encerramento das atividades de qualquer estabelecimento").
16. Nesse prisma, à parte das considerações materiais presentes nesta Resposta à Consulta, sobre a operacionalização e validação dos procedimentos formais expostos no relato, no que se refere a questões de ordem técnico-operacional, sugerimos que a Consulente dirija-se ao Posto Fiscal, tendo em vista que, de acordo com o artigo 62, incisos II e IV, do Decreto nº 66.457/2022, compete ao Posto Fiscal não só atender e orientar os contribuintes de sua vinculação, bem como executar os serviços internos necessários à formalização do registro cadastral dos contribuintes.
16.1. Nesse ponto, esclareça-se que, em tese, a empresa incorporadora terá direito ao saldo credor existente no estabelecimento da empresa incorporada a partir do momento da efetivação da transferência de titularidade do estabelecimento, ou seja, da data de incorporação da empresa. No entanto, como visto acima, o saldo credor é vinculado ao estabelecimento transferido e, em relação às questões formais para operacionalização da transferência desse saldo credor para a nova inscrição do estabelecimento transferido, a competência é do Posto Fiscal de vinculação desse estabelecimento.
16.2. Assim, (i) a empresa incorporadora terá direito ao saldo credor a partir do momento da efetivação da transferência de titularidade do estabelecimento; (ii) o saldo credor permanece, ao menos em um primeiro momento, vinculado ao estabelecimento transferido; e (iii) a competência para dispor sobre a operacionalização da transferência do saldo credor para a nova inscrição do estabelecimento transferido é do Posto Fiscal de vinculação do estabelecimento transferido.
17. Por derradeiro, tendo em vista a relevância do assunto, reitera-se que haverá a efetiva transferência integral do estabelecimento por meio do processo de incorporação e que este continuará a exercer suas atividades operacionais sobre o mesmo local físico, durante e após o processo de incorporação. Repisa-se que, atendendo à necessidade de continuidade do estabelecimento, a unidade operacional deve continuar ativa, com a manutenção de suas atividades, realizadas no mesmo local e com os mesmos ativos, etc., para que, assim, a incorporadora tenha direito ao aproveitamento dos créditos eventualmente existentes naquele estabelecimento, que passará à sua titularidade.
17.1. Recorda-se que essa manutenção da atividade do estabelecimento não deve ocorrer somente durante o processo de incorporação, mas também posteriormente, demonstrando, assim, a efetiva pretensão de solução de continuidade do estabelecimento. Findo o processo de incorporação, eventual ato sequencial de deslocamento das atividades operacionais do estabelecimento para outra localidade, por exemplo, pode, a depender da situação fática em concreto, indicar o real intuito de encerramento material daquela unidade, e se o deslocamento dessas atividades tiver por destino outro estabelecimento, denotar-se-á, então, o real intuito da empresa incorporadora de encerramento formal e material do estabelecimento adquirido por meio de incorporação. Assim, por regra, não se mantendo em atividade o estabelecimento, no mesmo local e com os mesmos ativos, não há que se falar em aproveitamento de créditos porventura existentes.
17.2. Nesse ponto, ressalte-se que, de acordo com o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, não é permitido ao particular se utilizar de meios formais para ocultar a materialidade das operações. Assim, se, porventura, verificada na situação concreta a utilização formal de negócios jurídicos para suprimir a real materialidade da operação, então, esses serão passíveis de desconsideração pela autoridade administrativa. Conclui-se, então que o processo de reestruturação societária não pode ser utilizado como subterfúgio para apropriação e aproveitamento de crédito que de outro modo não teria direito. Observa-se, ainda, que a fiscalização, em seu juízo de convicção para verificação da materialidade da operação, poderá se valer de indícios, estimativas e análise de operações pretéritas.
18. Com esses esclarecimentos, consideram-se dirimidas as dúvidas apresentadas na consulta.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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