Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Publicada no Diário Eletrônico em 26/06/2023
ICMS - Obrigações acessórias - Industrialização por conta de terceiros - Aquisição de gado bovino em pé por matriz remetido diretamente pelo estabelecimento rural a abatedouro (filial) para abate.
I. As operações de remessa de gado bovino em pé com destino a abatedouro (filial) e o retorno podem seguir, em relação às obrigações acessórias, os artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.
II. As operações de remessa de gado bovino em pé com destino a abatedouro (filial) e, também, o retorno ao autor da encomenda (matriz) dos produtos resultantes do referido abate têm o imposto diferido, nos termos do artigo 364 do RICMS/2000.
1. A Consulente, que tem como atividade principal registrada no CADESP a "fabricação de produtos de carne" (código 10.13-9/01 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE), relata que, para desenvolver suas atividades, em determinado momento da cadeia de produção, efetua o envio de gado em pé da matriz para ser abatido em sua filial, sendo ambos os estabelecimentos localizados no Estado de São Paulo, em municípios distintos.
2. Menciona que no envio do gado emite "Nota Fiscal de remessa para abate" e, posteriormente ao abate, a filial faz o processamento da carne e a envia à matriz, emitindo "Nota Fiscal de retorno de industrialização" do gado abatido.
3. Entende que pode enquadrar sua atividade como industrialização por conta de terceiros disciplinada pelos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000. Desse modo, expõe que a matriz (autor da encomenda) remete a totalidade das matérias-primas empregadas no processo de industrialização (gado em pé), emitindo Nota Fiscal referente à saída com o CFOP 5.901 (remessa para industrialização por encomenda), com suspensão do lançamento do imposto. A filial (industrializador), como apenas realiza o abate do gado com o processamento da carne, devolve toda a matéria-prima recebida (inclusive os resíduos industriais), emitindo Nota Fiscal com o CFOP 5.902 (retorno de mercadoria utilizada na industrialização por encomenda).
4. Diante do exposto, questiona se está correto seu entendimento de que pode aplicar a disciplina prevista nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000 à operação em questão e de que as mencionadas Notas Fiscais com os CFOPs citados acima são as únicas a serem emitidas.
5. De início, registre-se que nesta resposta está sendo assumido o pressuposto de que as operações da Consulente são com gado em pé bovino, visto que o relato não identificou a espécie comercializada. Considerando que não consta declarada no registro da Consulente no CADESP a atividade de "criação de gado bovino", está sendo assumida também a premissa de que o gado em pé bovino é adquirido pela Consulente de estabelecimento rural e enviado diretamente para abate, sem transitar por seu estabelecimento.
6. Isso posto, frise-se que a natureza da operação de remessa de mercadorias ou produtos entre estabelecimentos do mesmo titular é de transferência, conforme prevê o artigo 4º, inciso V, do RICMS/2000.
6.1. Vale pontuar que o STF, ao julgar a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49 (ADC 49), declarou a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho "ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular", e 13, §4º, da Lei Complementar Federal nº 87/1996.
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6.2. Em face de tal decisão, foram opostos Embargos de Declaração, os quais foram julgados em 19/04/2023, ocasião em que o Plenário da Suprema Corte esclareceu que a declaração de inconstitucionalidade do artigo 11, §3º, II, da Lei Complementar 87/1996 foi parcial, sem redução de texto, limitando-se a excluir do seu âmbito de incidência a cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular. Na mesma oportunidade, o STF julgou procedentes os Embargos de Declaração para modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, de forma que a decisão produza efeitos a partir de 01/01/2024.
6.3. Dessa forma, até 31/12/2023, os artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho "ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular", e 13, §4º, da Lei Complementar Federal nº 87/1996, continuam a produzir integralmente seus efeitos, de maneira que, via de regra, na transferência entre estabelecimentos do mesmo titular, o remetente deveria destacar o ICMS nos documentos fiscais, debitando-o em sua escrituração fiscal, ao passo que o destinatário deveria registrar o crédito do imposto em sua escrituração.
6.4. Ressalte-se que, após o esclarecimento feito pelo STF no sentido de que a declaração de inconstitucionalidade do artigo 11, §3º, II, da Lei Complementar 87/1996 foi parcial, sem redução de texto, mantém-se a autonomia dos estabelecimentos para os demais fins.
7. Nesse sentido, em face da autonomia dos estabelecimentos, também prevista no §2º do artigo 15 do RICMS/2000, e considerando que não há prejuízo ao erário, o Estado de São Paulo vem adotando a interpretação de que estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular, estabelecidos neste Estado, podem agir como autor e executor da encomenda, optando por valer-se das regras previstas nos artigos 402 e seguintes do mesmo Regulamento e na Portaria CAT 22/2007 (sistemática da industrialização por conta de terceiros).
8. É importante pontuar também que o abate de gado é uma atividade de industrialização e que, portanto, em princípio, seria possível a aplicação da disciplina de industrialização por conta de terceiros prevista nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000 no caso de remessa do gado pelo estabelecimento rural a outro estabelecimento para o abate. Todavia, havendo regras específicas de diferimento ou desoneração para as saídas internas de remessa e retorno, não se aplicam as regras gerais relativas à industrialização por conta de terceiro.
9. Convém lembrar, nesse ponto, que é entendimento sedimentado por este órgão consultivo que abatedouro é o local onde o gado é abatido, sendo que o estabelecimento que promove abate de gado em estabelecimento de terceiros é considerado estabelecimento abatedor.
9.1. Frise-se que a saída interna de gado de qualquer espécie promovida por estabelecimento rural com destino a estabelecimento abatedor, como é o caso da Consulente, é isenta, de acordo com no artigo 102 do Anexo I do RICMS/2000. Tal isenção compreende tão somente a operação de saída do gado em pé do estabelecimento rural paulista, não se estendendo às operações de remessa e retorno para abate em abatedouro, promovidas pela Consulente.
9.2. Logo, tratamento distinto ocorre com relação à remessa do gado em pé pela Consulente (abatedor) ao estabelecimento abatedouro (filial). Nesse caso, é preciso observar o que dispõe o artigo 364 do RICMS/2000, de modo que o diferimento do lançamento do imposto nas sucessivas operações com gado em pé: (i) abrange a operação de remessa do gado em pé realizada pela Consulente com destino ao abatedouro (filial); (ii) abrange o retorno ao seu estabelecimento dos produtos resultantes do referido abate; e (iii) se encerra no momento em que a Consulente efetuar a saída dos produtos comestíveis resultantes do abate.
10. De todo modo, ainda que não se possa aplicar a disciplina da industrialização por conta de terceiro em relação à tributação, a Consulente pode seguir, em relação às obrigações acessórias, os artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.
11. Pelas regras da industrialização por conta e ordem de terceiro, por ocasião do retorno da mercadoria industrializada, o estabelecimento industrializador deverá emitir Nota Fiscal tendo como destinatário o estabelecimento encomendante (Consulente) na qual constarão, além dos demais requisitos, aqueles previstos no artigo 404, dentre os quais o valor das mercadorias recebidas para industrialização, o valor das mercadorias próprias empregadas, bem como os serviços prestados.
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12. Considerando que o gado bovino em pé é enviado diretamente do estabelecimento rural para abate, por conta e ordem da Consulente, as seguintes Notas Fiscais deverão ser emitidas na operação:
12.1. Na Nota Fiscal emitida pelo estabelecimento rural:
12.1.1. relativa à "Remessa para Industrialização por conta e ordem do autor da encomenda", que acompanhará a remessa de boi vivo até o estabelecimento industrializador (artigo 406, I, "c", do RICMS/2000), deve ser utilizado o CFOP 5.924 ("remessa para industrialização por conta e ordem do adquirente da mercadoria, quando esta não transitar pelo estabelecimento do adquirente"); e
12.1.2. relativa à "Venda", em nome do estabelecimento autor da encomenda (matriz) (artigo 406, I, "a" e "b", do RICMS/2000), deve ser utilizado o CFOP 5.122 ("venda de produção do estabelecimento remetida para industrialização, por conta e ordem do adquirente, sem transitar pelo estabelecimento do adquirente");
12.2. Na Nota Fiscal emitida pela matriz, por ocasião da remessa do boi vivo efetuada pelo fornecedor diretamente ao estabelecimento industrializador, relativa à "Remessa simbólica de insumos" (artigo 406, II, "a", do RICMS/2000), deve ser utilizado o CFOP 5.949 ("outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificado").
12.3. Na Nota Fiscal emitida pela filial, por ocasião da remessa dos produtos resultantes do abate à matriz, a qual deve ser emitida conforme prevê o artigo 404 do RICMS e o artigo 406, III, "a", do RICMS/2000, além dos demais requisitos previstos na legislação, devem ser utilizados os seguintes CFOPs:
12.3.1. o CFOP 5.125 ("industrialização efetuada para outra empresa quando a mercadoria recebida para utilização no processo de industrialização não transitar pelo estabelecimento adquirente da mercadoria") nos itens correspondentes aos serviços prestados e energia elétrica;
12.3.2. o CFOP 5.925 ("retorno de mercadoria recebida para industrialização por conta e ordem do adquirente da mercadoria quando aquela não transitar pelo estabelecimento do adquirente") nos itens correspondentes ao boi vivo recebido para abate, cujo valor deve corresponder ao valor recebido com o CFOP 5.924 ("remessa para industrialização por conta e ordem do adquirente da mercadoria, quando esta não transitar pelo estabelecimento do adquirente").
13. Com esses esclarecimentos, consideramos dirimidas as dúvidas da Consulente.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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