Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Publicada no Diário Eletrônico em 20/05/2022
ICMS - Produtor rural - Óbito do titular - Transferência da titularidade de estabelecimento aos herdeiros - Continuidade das atividades - Aproveitamento de créditos.
I. É possível o aproveitamento do crédito do ICMS decorrente da aquisição de insumos agrícolas e combustíveis por produtor rural, desde que diretamente empregados ou consumidos no processo de produção rural, observadas as disposições dos artigos 59 e 61 do RICMS/2000, sendo que é vedado o crédito relativo à mercadoria entrada ou adquirida, bem como ao serviço tomado, alheios à atividade do estabelecimento.
II. No caso de falecimento do proprietário de estabelecimento rural de produtor, tendo seu(s) sucessor(es) continuado a explorar atividade rural, no mesmo estabelecimento, entende-se que não há impedimento ao aproveitamento do crédito por parte do estabelecimento atualmente explorado por sucessor(es) do antigo titular.
1. A Consulente, sociedade de produtores rurais, que tem como atividade principal a de cultivo de cana-de-açúcar (CNAE 01.13-0/00), relata que dois estabelecimentos rurais contíguos ("fazendas"), devidamente registrados no Cadastro de contribuintes do Estado de São Paulo, foram transmitidos integralmente aos herdeiros (a viúva, duas filhas e dois filhos), em decorrência do falecimento de seu titular, ocorrido em 27/08/2017.
2. Acrescenta que, com base nas disposições do artigo 12, inciso I, alínea ‘d’, do Anexo III, da Portaria CAT 92/2018, os herdeiros solicitaram a baixa da inscrição estadual dos dois estabelecimentos em comento, sendo criado um novo estabelecimento (Inscrição Estadual) que reuniu todos os bens corpóreos e incorpóreos, inclusive o próprio local para o exercício ininterrupto e integral da atividade agropecuária ("terras, máquinas e equipamentos, insumos, material de consumo"), que antes compunham os dois estabelecimentos rurais em questão, os quais tiveram suas inscrições baixadas.
3. Informa que os sucessores herdeiros continuam explorando a mesma atividade que explorava o autor da herança.
4. Expõe que os estabelecimentos cujas inscrições foram baixadas possuíam créditos do ICMS, oriundos da aquisição de óleo diesel consumidos na produção agrícola, anteriores à sucessão, com as seguintes características:
4.1. Créditos devidamente registrados no Sistema eCredRural;
4.1.1. Argumenta que o disposto no artigo 69 do RICMS/2000 viola o direito dos herdeiros a receberem a herança total que lhes é cabida, ao impedir que parte da herança em créditos fiscais herdada juntamente com os estabelecimentos rurais já encerrados não lhes seja transferida, já que está obrigado pela legislação a baixar sua inscrição estadual (artigo 12, inciso I, "d", do Anexo III da Portaria CAT 92/1998).
4.1.2. Acrescenta, ainda, que a transmissão de bens por causa mortis compreende o conjunto de bens e direitos deixados pelo de cujus, o que incluiria, nesse caso, os créditos já lançados na conta fiscal do eCredRural.
4.2. Créditos reconhecidos como legítimos pela Delegacia Tributária de vinculação dos estabelecimentos, mas não apropriados no eCredRural.
4.2.1. Diz que, em janeiro de 2019, foi formalizado o pedido de apropriação de créditos pela aquisição de óleo diesel por uma das fazendas enquanto sua inscrição estava ativa. Embora tenha sido determinado o lançamento do crédito na respectiva conta corrente do eCredRural, o pedido foi, ao final, indeferido, por perda de objeto, pois constatou-se a baixa da inscrição estadual requerida pelos interessados durante a análise do pedido, impossibilitando a apropriação do crédito.
4.3. Crédito estimado, referente a documentos fiscais de compras "realizadas no período de janeiro de 2018 a julho de 2019 pelode cujus", mas ainda não requerido.
4.3.1. Em seu entendimento, por tais documentos fiscais terem sido emitidos em favor do autor da herança, é possível legitimar sua apropriação pelos herdeiros sucessores no novo estabelecimento rural utilizando-se do instituto da doação, já que herança e doação se configuram igualmente como forma de transmissão de patrimônio e são ambas fato gerador do ITCMD.
4.3.2. Cita a Resposta à Consulta Tributária 6107/2015, transcrevendo seu item II, como se lê: "II. No caso de doação de estabelecimento rural, observadas as disposições da Portaria CAT-153/11, o donatário da propriedade poderá apropriar- se de eventuais créditos do ICMS, relativamente às aquisições de combustíveis realizadas pelo estabelecimento rural, corretamente destacado no documento fiscal emitido em nome do doador da propriedade rural, que não tenha sido apropriado à época própria.".
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5. Afirma que, em 20/05/2020, requereu ao Posto Fiscal de vinculação a transferência dos créditos registrados no eCredRural (item 4.1) nas contas dos estabelecimentos rurais baixados para a conta no eCredRural do novo estabelecimento rural, nos termos do artigo 41 da Portaria CAT 153/2011.
5.1. Expõe que o pedido foi indeferido em razão de impossibilidade técnica, uma vez que o novo estabelecimento ainda não estava credenciado no Sistema eCredRural e não possuía conta corrente. Entretanto, havia pedido de credenciamento em análise, atualmente já concluído.
6. Diante do exposto indaga:
6.1. se é legítimo transferir os créditos existentes na conta do eCredRural dos estabelecimentos rurais baixados para a conta do estabelecimento rural sucessor;
6.2. se é legítimo transferir os créditos solicitados anteriormente por um dos estabelecimentos rurais, antes de ter sua inscrição estadual baixada, que foram considerados legítimos pela Delegacia Regional Tributária competente, mas que não chegaram a ser registrados na conta corrente do estabelecimento;
6.3. se é legítima a apropriação na conta do eCredRural do estabelecimento rural sucessor, na qualidade de donatário, dos créditos referentes à aquisição de combustíveis feita pelo autor da herança em nome de um dos estabelecimentos rurais que teve sua inscrição baixada, na qualidade de doador, corretamente destacados em documentos fiscais de compra e não apropriados à época própria.
7. Anexa cópias digitais dos pedidos de apropriação de créditos apresentados à Delegacia Regional Tributária de vinculação.
8. Inicialmente, observa-se que, diante das disposições dos artigos 59 e 61 do RICMS/2000, e considerando que as saídas promovidas por produtor rural sejam tributadas, ainda que amparadas pelo diferimento do imposto, é possível o aproveitamento do crédito do ICMS decorrente da aquisição de insumos, desde que diretamente utilizados na sua atividade produtiva.
9. Note-se que, no caso de atividade rural, entende-se como insumos todos os produtos que integram o produto final ou são consumidos no processo de produção agrícola, compreendendo, entre outros, os combustíveis empregados ou consumidos no processo de produção rural (item 3.5 da Decisão Normativa CAT 1/2001).
10. Ressalte-se, ainda, o disposto no inciso I do artigo 66 do RICMS/2000, segundo o qual, salvo disposição em contrário, é vedado o crédito relativo à mercadoria entrada ou adquirida e ao serviço tomado, alheios à atividade do estabelecimento.
11. No que se refere à aquisição de óleo diesel, mercadoria sujeita ao regime da substituição tributária (artigo 412, inciso II, do RICMS/2000), o aproveitamento do crédito do imposto referente às respectivas entradas deve observar o disposto no artigo 272 do RICMS/2000.
12. Assim, observados os requisitos previstos na legislação (artigos 59, 61 e seguintes), notadamente, na disciplina da Portaria CAT-153/2011, em regra, o produtor rural pode apropriar-se de eventuais créditos do ICMS, relativamente às aquisições de óleo diesel realizadas pelo estabelecimento rural, corretamente destacados em documentos fiscais.
13. Prosseguindo, esclarecemos que é entendimento deste órgão consultivo, conforme já manifestado em outras oportunidades, com base nos artigos 59 e seguintes do RICMS/2000, que o crédito do produtor rural, em virtude de sua natureza e finalidade, está diretamente vinculado ao estabelecimento produtor; tanto assim, que se o produtor "A" vende seu estabelecimento para o produtor "B", este último pode apropriar-se de eventual crédito gerado quando o produtor "A" era o proprietário.
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14. Portanto, não há que se falar em transferência, por doação ou herança, do crédito do ICMS relativamente às aquisições realizadas antes do falecimento do titular ou após, pelo espólio, já que, conforme mencionado, o crédito do imposto deve ser diretamente atribuído ao estabelecimento e não ao seu titular. Tal atribuição, contudo, ocorrerá somente se houver, de fato, a sucessão da titularidade do estabelecimento e a continuidade das atividades rurais ali praticadas.
15. No caso de falecimento do proprietário de estabelecimento rural de produtor, tendo seu(s) sucessor(es) continuado a explorar atividade rural, no mesmo estabelecimento, entendemos não haver impedimento ao aproveitamento do crédito por parte do estabelecimento atualmente explorado por sucessor(es) do antigo titular. Importante anotar, nesse ponto, que a sucessão de estabelecimento de produtor rural, cuja natureza jurídica é de pessoa física, não segue as mesmas regras aplicadas à sucessão empresarial de pessoas jurídicas.
16. No caso em tela, nota-se que os estabelecimentos originais, transmitidos aos herdeiros, encontram-se de fato com as inscrições estaduais baixadas desde dezembro de 2019. Nesse ponto, recorda-se que o encerramento das atividades do estabelecimento acarreta, por regra, a perda do saldo credor porventura existente, tendo em vista disposto no artigo 69, inciso II, do RICMS/2000, que proíbe a restituição ou a autorização para aproveitamento de saldo de crédito existente na data do encerramento das atividades de qualquer estabelecimento.
16.1. Ademais, por força do § 5º, item 1, do artigo 17 da Portaria CAT-153/2011, a conta corrente do e-CredRural será encerrada quando a inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS do estabelecimento for enquadrada como baixada.
17. Todavia, é preciso considerar que o estabelecimento do Consulente teve sua inscrição estadual concedida a partir de junho de 2019, o que parece demonstrar a continuidade das atividades desenvolvidas pelo sucedido, salvo prova em contrário a ser obtida por meio de atividade fiscalizatória.
18. Feita essas considerações, entende-se que a hipótese trazida a exame parece ser de mera mudança na titularidade dos estabelecimentos rurais por meio de sucessão, com continuidade das atividades e, dessa forma, os novos titulares assumem esse complexo de bens, direitos e obrigações na sua totalidade. Ou seja, o fato dos estabelecimentos terem sido herdados em nada altera os seus direitos e obrigações na esfera tributária.
19. Obviamente, o direito ao crédito, bem como a sua efetiva utilização, como já mencionado, estão condicionados ao cumprimento de todos os requisitos previstos na legislação. Além disso, entendemos que eventuais entraves técnico-operacionais para o exercício desse direito, decorrentes da atual situação cadastral dos estabelecimentos sucedidos (condição diversa da verificada no período compreendido entre o período de junho e dezembro de 2019, quando os estabelecimentos sucedidos e sucessor encontravam-se ativos) não podem obstá-lo, cabendo ao Posto Fiscal fornecer as orientações necessárias.
19.1. Nesse sentido, ressalta-se que, conforme o artigo 40 da Portaria CAT 153/2011 abaixo transcrito, a decisão sobre os pedidos de credenciamento ao sistema e-CredRural e de apropriação de crédito do ICMS de produtores rurais e cooperativas de produtores rurais, inclusive sua legitimidade, em face de caso concreto, é prerrogativa do Delegado Regional Tributário:
"Artigo 40 - A competência para a decisão dos pedidos de que trata esta portaria é do Delegado Regional Tributário da área de vinculação do estabelecimento requerente, podendo ser delegada, total ou parcialmente."
20. Por fim, cabe-nos esclarecer que não compete a este órgão consultivo manifestar-se quanto às decisões proferidas no âmbito do processo administrativo relacionado ao caso aqui analisado.
21. Com esses esclarecimentos, consideram-se sanadas as dúvidas apresentadas pela Consulente.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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