Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Disponibilizado no site da SEFAZ em 02/03/2021
ICMS - Entidade de assistência social - Imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea "c" da Constituição Federal de 1988 - Incidência.
I. A imunidade constitucional estabelecida pelo artigo 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição Federal é prevista apenas para as hipóteses em que os impostos recaem diretamente sobre o patrimônio, a renda e os serviços das instituições sem fins lucrativos.
II. O ICMS, afora as prestações de serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicação, tem como objeto as operações relativas à circulação de mercadorias, não se enquadrando, assim, no conceito de impostos sobre patrimônio, renda e serviços.
III. Para fins de enquadramento como contribuinte do ICMS, a caracterização do intuito comercial depende da habitualidade ou do volume de operações relativas à circulação de mercadorias, e não do caráter assistencial ou educacional previsto para a pessoa que praticar as operações.
IV. Ao pretender praticar operações relativas à circulação de mercadorias, a instituição, mesmo que não tenha fins lucrativos, se enquadrará na condição de contribuinte do ICMS, estando obrigada à prévia inscrição no cadastro de contribuintes deste Estado e ao cumprimento das obrigações principal e acessórias previstas na legislação do imposto estadual.
V. Desde que preenchidos os requisitos do artigo 31 do Anexo I do RICMS/2000, a entidade assistencial ou de educação poderá aplicar a isenção na saída de mercadoria de produção própria.
1. A Consulente, que exerce a atividade principal de atividades associativas não especificadas anteriormente (CNAE 94.99-5/00), e secundária de comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios (CNAE 47.81-4/00), apresenta questionamento acerca da incidência do ICMS na venda de produtos recebidos em doação em bazar permanente, bem como o cumprimento de obrigações acessórias.
2. Nesse contexto, esclarece sua atuação na área da assistência social, que ocorre por meio de atendimento direto a população carente, por meio de programas socioeducacionais e de formação para o mundo do trabalho, sendo devidamente reconhecida como instituição imune ao ITCMD pela Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.
3. Acrescenta que recebe doações de bens usados, tanto de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas (empresas parceiras), que são vendidos por meio de bazar permanente que realiza e cujo resultado é integralmente destinado ao custeio de sua atividade fim de assistência social. Ressalta que os produtos doados pelas empresas parceiras são produtos que iriam para descarte.
4. A Consulente expõe os motivos pelo qual entende que não está obrigada a emitir Nota Fiscal de entrada e de saída das mercadorias por entender que não há incidência do ICMS nas vendas de mercadorias doadas realizadas por meio de bazar. Em seu entendimento, está obrigada tão somente a emitir recibo de venda de bens, com identificação do comprador, do bem e de seu valor.
5. Por fim, apresenta os seguintes questionamentos:
5.1. Os bens usados, doados por pessoas físicas, ou de descarte, doados por pessoas jurídicas e que a Consulente vende por meio de bazar são considerados bens ou mercadorias?
5.2. A venda realizada pela Consulente dos produtos recebidos em doação por pessoas físicas e jurídicas em bazar pode ser considerada atividade com intuito comercial?
5.3. No caso dos produtos doados e que são vendidos pela Consulente serem considerados como mercadorias e a venda em bazar permanente caracterizar intuito comercial, a Consulente pode aplicar a imunidade aos impostos prevista no artigo 150, inciso VI, alínea "c" e § 4º da Constituição Federal de 1988
5.4. No caso da Consulente estar obrigada a fazer inscrição estadual e a emitir Nota Fiscal relativa à entrada e à saída dos bens, como devem ser emitidas as Notas Fiscais para que não haja incidência do ICMS?
5.5. Caso a Consulente não esteja obrigada à emissão de Nota Fiscal, a emissão de recibo de venda com a identificação do bem e do comprador é suficiente para o cumprimento do disposto no artigo 14, inciso III do Código Tributário Nacional - CTN?
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6. Inicialmente, cabe esclarecer que este Órgão Consultivo tem entendido, em análise aos critérios estabelecidos pelo artigo 150, inciso VI, alínea "c", e § 4º, da Constituição Federal, que esse dispositivo constitucional proíbe, tão-somente, a cobrança de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços das entidades ali especificadas.
6.1. A imunidade constitucional referida é prevista apenas para as hipóteses que gravam diretamente o patrimônio, a renda e os serviços dessas entidades, como acontece com o Imposto Territorial e Predial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), que recaem sobre o patrimônio, ou com o Imposto de Renda - Pessoa Jurídica, que grava a renda auferida em determinado período. Ressalte-se que, nesses casos, a imunidade será aplicada quando o objeto da obrigação tributária, a ser afastada, estiver necessariamente relacionado com as finalidades essenciais da entidade.
6.2. O ICMS, afora as prestações de serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicação, tem como objeto as operações relativas à circulação de mercadorias, não se enquadrando, assim, no conceito de impostos sobre o patrimônio, a renda e serviços. Dessa maneira, o ICMS não se encontra sob o abrigo da imunidade prevista no artigo 150, VI, "c", da Constituição Federal.
7. Essa interpretação encontra respaldo nas reflexões do Professor Sacha Calmon Navarro Coêlho, em sua obra: "Comentários à Constituição de 1988 - Sistema Tributário", 6ª edição, página 349:
"A imunidade das instituições de educação e assistência social as protege da incidência do IR, dos impostos sobre o patrimônio e dos impostos sobre serviços, não de outros, quer sejam as instituições contribuintes "de jure ou "de facto. Destes outros só se livrarão mediante isenção expressa, uma questão diversa".
8. Nesse sentido, cumpre salientar que o caráter assistencial/educacional da Consulente está diretamente relacionado com seu objetivo principal. Todavia, para fins de caracterização como contribuinte do ICMS, a deflagração do intuito comercial depende da habitualidade ou do volume de operações relativas à circulação de mercadorias, e não resvala na finalidade assistencial prevista para a entidade. Nesse sentido, dispõe o artigo 9º e 19 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto 45.490/2000, RICMS/2000:
"Artigo 9º - Contribuinte do imposto é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que de modo habitual ou em volume que caracterize intuito comercial, realize operações relativas à circulação de mercadorias ou preste serviços de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação (Lei 6.374/89, art. 7º, na redação da Lei 9.399/96, art. 1°, III)".
[...]
Artigo 19 - Desde que pretendam praticar com habitualidade operações relativas à circulação de mercadoria ou prestações de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação, deverão inscrever-se no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes do início de suas atividades:
[...]
XII - os partidos políticos e suas fundações, os templos de qualquer culto, as entidades sindicais de trabalhadores, as instituições de educação ou de assistência social, sem fins lucrativos.;
[...]".
9. Diante do exposto, ainda que se caracterize como instituição de assistência social sem fins lucrativos e mesmo revertendo sua renda para obras sociais/educacionais, a entidade pode revestir-se da condição de contribuinte do imposto, nos termos do artigo 9º transcrito, na medida em que comercializar mercadorias de forma habitual. E, assim, o estabelecimento que praticar as referidas operações deve realizar sua inscrição no cadastro de contribuintes deste Estado e submeter-se a todas as demais regras do RICMS/2000, inclusive quanto às respectivas obrigações acessórias estabelecidas nesse regulamento, como a emissão de Nota Fiscal (artigo 498 do RICMS/2000).
10. Assim, por todo o exposto, conclui-se que a Consulente, ao comercializar, com habitualidade, em bazar permanente, mercadorias que recebe em doação, efetua a circulação de mercadorias e, por isso, enquadra-se como contribuinte do ICMS, devendo cumprir com as obrigações principais e acessórias atinentes a esse imposto.
11. Recorda-se que o artigo 31 do Anexo I do RICMS/2000 prevê a possibilidade de isenção sobre a saída de mercadoria de produção própria promovida por instituição de assistência social ou de educação, condicionada, no entanto, ao reconhecimento por esta Secretaria da Fazenda, a pedido da interessada (Consulente). Desse modo, preenchendo os requisitos do artigo citado, a Consulente poderá aplicar a referida isenção nas saídas que realizar.
12. Diante de todo o exposto, consideram-se os questionamentos dos itens 5.1, 5.2 e 5.3 respondidos e os demais, prejudicados.
13. Tendo em vista que vem procedendo de maneira diversa ao ora exposto, recomenda-se à Consulente que procure o Posto Fiscal ao qual estão vinculadas suas atividades a fim de regularizar os procedimentos adotados que estejam em eventual desacordo com a presente resposta, valendo-se para isso da denúncia espontânea de que trata o artigo 529 do RICMS/2000.
14. Por fim, em vista do pedido de extensão do prazo para efeitos da presente resposta, solicitado no intuito da devida adequação aos procedimentos aqui expostos, cumpre esclarecer que a extensão do prazo pode ser excepcionalmente concedido pela Consultoria, com base nos critérios de conveniência e oportunidade da administração. No entanto, no presente caso, não se verificou elementos suficientes que justifiquem a prorrogação de prazo dos efeitos da presente Resposta à Consulta. Assim, deve ser seguido o prazo ordinário de 15 dias, conforme o § 1º do artigo 518 do RICMS/2000.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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