Órgão: Consultoria Tributária da Sefaz de São Paulo.
Disponibilizado no site da SEFAZ em 24/05/2018.
ICMS - Industrialização por conta de terceiro - Incidência.
I. A atividade de industrialização, em quaisquer das suas modalidades (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), se executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda, caracteriza-se como industrialização por conta de terceiro e se sujeita à incidência somente do imposto estadual.
1. A Consulente, que exerce a atividade de serviços de acabamento em fios, tecidos, artefatos têxteis e peças do vestuário (CNAE 13.40-5/99), optante pelo regime do Simples Nacional, relata que fabrica e aplica resinas, sob encomenda, em tecidos de propriedade de seus clientes, pessoas jurídicas, que fornecem o tecido e encomendam a resinagem específica que necessitam, caracterizando-se como uma etapa no processo de industrialização na modalidade transformação. Após a aplicação da resina realizada pela Consulente, o produto transformado não está apto a ser destinado ao consumidor final, necessitando de outro processo de industrialização a ser realizado por terceiro. Ressalta que não possui consumidor final dentre os seus clientes, uma vez que após o seu trabalho o produto retorna ao seu cliente/encomendante que, então, irá disponibilizá-lo para terceiros que irão proceder à industrialização final e colocar o produto à disposição do consumidor final (varejo).
2. Prossegue, informando que a remessa do produto a ser industrializado é acompanhada por Nota Fiscal com a indicação do CFOP 5.901 ("Remessa para industrialização por encomenda"), com destaque de sua encomenda na saída. Após a industrialização do produto, emite Nota Fiscal com o CFOP 5.124 ("Industrialização efetuada para outra empresa", com destaque para valores dos serviços prestados e das mercadorias de propriedade do industrializador) e 5.902 ("Retorno de mercadoria utilizada na industrialização por encomenda").
3. Cita diversos dispositivos da legislação, como o Anexo II da Lei Complementar nº 123/2006 e os artigos 1º, inciso IV, o 2º, inciso III, alínea "a", o 4º, inciso I, e o 402, todos do RICMS/2000, indicando que as operações por ela realizadas são disciplinadas por este último, qual seja, a industrialização por encomenda, que configura hipótese de incidência do ICMS. E que, por isso, esclarece que sempre recolheu o ICMS e nunca ISSQN, de competência municipal, sobre as operações em tela.
4. Diante do exposto, questiona se está correto o entendimento de que as operações relatadas (industrialização por conta de terceiros, disciplinada pelo artigo 402 do RICMS/2000) configura hipótese de incidência do ICMS, ou se a transformação da matéria prima recebida (tecido) em novo produto, por meio de aplicação de resina desenvolvida de acordo com o pedido do cliente, sendo que o novo produto não é destinado ao consumidor final, de qualquer maneira, mas devolvido ao encomendante, deve estar sujeita à incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN).
5. Preliminarmente, esclarecemos que a presente resposta ater-se-á à questão específica da hipótese de incidência tributária nas operações em tela, objeto do questionamento da Consulente. Não nos manifestaremos a respeito do cumprimento das obrigações acessórias correspondentes, citadas de modo apenas superficial no relato e não compreendidas no questionamento propriamente dito.
6. Como é informado no relato, a Consulente não presta um serviço sobre bem pertencente a usuário ou consumidor final, mas realiza industrialização em mercadoria de contribuinte do ICMS, por sua conta e ordem. E o produto resultante dessa industrialização é objeto de posterior comercialização e/ou industrialização pelo autor da encomenda.
7. Isso posto, salienta-se que a matéria em questão já foi analisada por esta Consultoria Tributária em diversas ocasiões, como nas Respostas às Consultas 16431/2017, 15435/2017, 11894/2016, 11759/2016, 6190/2015, 4778/2015, 2467/2013, 238/2012, 204/2012, 189/2012, 177/2012 e 705/2009, todas publicadas no sítio desta Secretaria da Fazenda (www.portal.fazenda.sp.gov.br), através do caminho "Acesso à informação/Tributos-Legislação, Benefícios e Indicadores/Legislação Tributária/Respostas de Consultas".
8. Nesse sentido, reitera-se o posicionamento desta Consultoria de que a industrialização executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização, é a industrialização prevista no artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000, sendo, nesse caso, industrialização por conta de terceiro. E, em sendo industrialização por conta de terceiro, o ICMS incide sobre essa atividade na medida em que essa industrialização está inserida no ciclo de produção e comercialização da mercadoria. Ou seja, a atividade é efetuada sobre mercadoria destinada a posterior comercialização pelo autor da encomenda e não prestação de serviço a consumidor usuário final.
9. Com efeito, é notório que a Constituição Federal, em linhas gerais, repartiu entre os entes federativos a competência da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que a atividade se encontra: industrial (União); comercial (Estados e Distrito Federal); e prestação de serviços (Municípios e Distrito Federal).
10. Nesse contexto, especificamente no que tange ao ICMS, ele incide sobre as "operações relativas à circulação de mercadorias", que fundamentalmente são aquelas operações que impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Tais operações implicam a obrigação de dar (a mercadoria), mas, no entanto, em algum momento da cadeia produtiva, pode surgir, concomitantemente ou não, uma "obrigação de fazer", sem que isso altere a natureza da operação.
11. Diante disso, a mesma atividade realizada - com ou sem emprego de materiais - pode constituir-se uma operação de industrialização voltada à mercancia (ICMS) ou uma prestação de serviço (ISSQN). Com efeito, o fato de determinada atividade constar na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 como prestação de serviço sujeita ao ISSQN, por si só, não inviabiliza que essa atividade seja, de fato e de direito, apenas uma etapa do ciclo de produção e comercialização da mercadoria e, dessa forma, estar sob a incidência do ICMS (art. 2º, inciso III, alínea "a", do RICMS/2000).
12. Negar essa constatação e querer tributar por ISSQN o fornecimento de uma atividade, ainda que imaterial, envolta no ciclo produtivo, é ofender a não cumulatividade. Isso porque o imposto pago sobre o serviço seria agregado ao custo de produção e de comercialização subsequentes, onerando-o, sem a possibilidade de compensação, portanto, em nítido descompasso com o objetivo constitucional.
13. Além disso, não é razoável, ante as complexidades técnicas encontradas no ciclo produtivo, querer-se entender que a simples preponderância da atividade imaterial/intelectual, ou mesmo a produção personalíssima sob encomenda, seja um critério finito e único para a conceituação e definição de serviço para fins de incidência do ISSQN.
14. Sendo assim, a destinação da mercadoria sobre a qual é executada a atividade é elemento determinante para identificar a etapa do ciclo econômico em que essa atividade se localiza e, desse modo, é também um dos elementos fundamentais para se estabelecer a incidência do imposto competente.
15. Essa mesma linha de entendimento é atualmente seguida pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões sobre o tema de industrialização por encomenda, como pode ser observado das seguintes decisões: (i) ADI nº 4.389/DF-MC; (ii) AI nº 803.296/SP-AgR; e (iii) RE nº 606.960/ES-AgR - essas duas últimas de ementas bastante elucidativas, motivo pelo qual seguem excertos abaixo:
"1. Em precedente da Corte consubstanciado na ADI nº 4.389/DF-MC, restou definida a incidência de ICMS sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria.
2. A verificação da incidência nas hipóteses de industrialização por encomenda deve obedecer dois critérios básicos: (i) verificar se a venda opera-se a quem promoverá nova circulação do bem e (ii) caso o adquirente seja consumidor final, avaliar a preponderância entre o dar e o fazer mediante a averiguação de elementos de industrialização.
(...)
4. À luz dos critérios propostos, só haverá incidência do ISS nas situações em que a resposta ao primeiro item for negativa e se no segundo item o fazer preponderar sobre o dar." (AI nº 803.296/SP-AgR).
(...)
3. Na industrialização por encomenda, se o bem retorna à circulação, tal processo industrial representa apenas uma fase do ciclo produtivo da encomendante, não estando essa atividade, portanto, sujeita ao ISSQN, como é o caso dos presentes autos. (RE nº 606.960/ES-AgR)"
16. Com efeito, na industrialização por conta de terceiro, sequer é necessário analisar a preponderância entre o dar e o fazer, já que a industrialização por conta de terceiro é uma etapa do processo produtivo em que terceiro executa atividade em mercadoria alheia que posteriormente será comercializada ou se submeterá a outro processo de industrialização. Dessa feita, a industrialização por conta de terceiro se configura como etapa do processo de circulação de mercadoria e deve ser tributada pelo ICMS.
17. Nesse contexto, e a contrário senso, para se constituir fato gerador do ISSQN, o serviço prestado ("obrigação de fazer") deve estar elencado na lista de serviço anexa à Lei Complementar nº 116/2003 e ser executado sobre bem pertencente a usuário ou consumidor final. Portanto, é pressuposto, para a incidência do ISSQN, tratar-se de bem de terceiro, ou seja, bem de propriedade de usuário ou consumidor final.
18. Do exposto, é possível concluir que a Consulente, quando contratada para executar a atividade supramencionada de industrialização, a pedido do encomendante, contribuinte do ICMS, em mercadoria que será submetida a outro processo de industrialização e, posteriormente, comercializada, estará executando uma etapa do respectivo processo produtivo, ou seja, uma forma de industrialização por conta de terceiro (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), de modo que tais serviços sujeitam-se à incidência do ICMS.
Nota:
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.
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